Compartilhe

O Direito Constitucional Privado e a Proteção da Inovação Tecnológica

O Papel da Inovação no Desenvolvimento Econômico e Social

Ao longo dos últimos séculos, o mundo passou por uma série de avanços industriais e de grande impacto no desenvolvimento de novas tecnologias. A inovação tecnológica é um marco histórico do desenvolvimento econômico e social contemporâneo.

A transformação digital molda nosso tempo. Novas tecnologias surgem e alteram mercados, padrões de consumo e relações sociais. Ao mesmo passo, observamos uma constante criação de novas ferramentas digitais, compreendendo até mesmo uma realidade paralela, conhecida como meta verso.

Nesse contexto, o Direito desempenha um papel fundamental na regulamentação das atividades ligadas à inovação, garantindo um equilíbrio entre a proteção dos direitos dos indivíduos e o estímulo ao avanço tecnológico.

O Direito Constitucional Privado e a Inovação

O Direito Constitucional Privado é essencial para esse equilíbrio, pois conecta princípios constitucionais às normas privadas. Ele se aplica a casos de interação social nos novos cenários digitais.

O Direito Constitucional Privado reflete a crescente constitucionalização das relações privadas, as quais sofrem influência dos valores e direitos fundamentais previstos na Constituição sobre os contratos, negócios jurídicos e outras interações privadas.

Esse cenário, aplicado às inovações tecnológicas, busca assegurar que os avanços industriais sejam realizados de forma ética, respeitando os direitos fundamentais, como a dignidade da pessoa humana, a privacidade e a livre iniciativa.

Por outro lado, o Direito Constitucional Privado também oferece mecanismos para proteger os frutos da inovação, garantindo direitos de propriedade intelectual, liberdade econômica e segurança jurídica.

Inovação Tecnológica e os Princípios Constitucionais

A Constituição Federal de 1988 estabelece as bases para a proteção da inovação tecnológica, reconhecendo a importância do progresso científico e tecnológico para o desenvolvimento nacional.

Dentre os princípios constitucionais, cumpre destacar a dignidade da pessoa humana, a livre iniciativa/concorrência, a função social da propriedade e a proteção ao consumidor.

A Constituição incentiva a inovação, mas também impõe limites às relações sociais. Isso garante a dignidade da população e protege o consumidor. O princípio da dignidade humana, estampado no art. 1º, III, consiste em um dos fundamentos que norteiam e orientam todo o ordenamento jurídico brasileiro.

A inovação tecnológica exige limites éticos para preservar relações sociais. Assim, evita-se o desvirtuamento das tecnologias e assegura-se sua função social.

O tratamento indevido de dados, a manipulação genética e tecnologias que violem direito fundamentais são inaceitáveis, mesmo que lucrativas.

Inovação Tecnológica e os Princípios Constitucionais

Ainda assim, a Constituição estabelece garantias voltadas ao regular desenvolvimento dessas novas tecnologias, tais quais a livre iniciativa e concorrência previstos nos artigos 1º, IV, e 170 da Constituição.

A inovação tecnológica está intrinsecamente ligada a esse princípio, pois depende da liberdade dos agentes econômicos para criar, desenvolver e comercializar novos produtos e serviços.

A livre concorrência, por sua vez, garante que o mercado se mantenha dinâmico, incentivando a inovação ao evitar a formação de monopólios e práticas anticompetitivas.

No decorrer da Constituinte, muito se discutiu acerca da visão social que deveria ser incorporada à Constituição. Dentre os debates, a função social da propriedade privada passou a compor o texto constitucional.

A propriedade intelectual, incluindo patentes, marcas e direitos autorais, também integra esse conceito. A Constituição a protege no artigo 5º, incisos XXVII e XXIX. Contudo, essa proteção está condicionada à função social da propriedade, o que significa que a inovação tecnológica deve beneficiar a sociedade, seja ao oferecer soluções práticas para problemas reais, seja ao promover o bem-estar coletivo.

Por fim, a Constituição também assegura a defesa do consumidor (art. 170, V), de forma que este se torna agente especialmente relevante no contexto das inovações tecnológicas, onde novos produtos e serviços podem envolver riscos desconhecidos, sendo prejudiciais à sociedade.

A regulamentação de tecnologias emergentes, como inteligência artificial e internet das coisas, busca garantir que os consumidores sejam protegidos contra práticas abusivas ou danos decorrentes de falhas tecnológicas.

O Contexto Jurídico na Proteção da Inovação Tecnológica

O Direito Constitucional Privado harmoniza direitos fundamentais e princípios constitucionais com as normas aplicáveis às relações privadas, estabelecendo um arcabouço jurídico que protege tanto os inovadores quanto os beneficiários das tecnologias.

Quando abordamos acerca do direito a ser tutelado, é importante realizar o recorte individualizado de cada um deles. Esse artigo abordará propriedade intelectual, privacidade e proteção de dados, desenvolvimento socioeconômico e defesa do consumidor.

Propriedade Intelectual e Interesse Público

O primeiro versa acerca do reconhecimento de patentes, marcas e direitos autorais é um dos mecanismos centrais para proteger a inovação tecnológica. Esses direitos, previstos na Constituição e regulamentados por leis específicas, como a Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/1996) e a Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/1998), incentivam o desenvolvimento ao garantir que os criadores possam explorar economicamente suas invenções.

Contudo, o equilíbrio entre a proteção da propriedade intelectual e o interesse público é um desafio constante. Por exemplo, o abuso de direitos de propriedade intelectual pode limitar o acesso a tecnologias essenciais, como medicamentos inovadores, o que exige a intervenção do Estado para regular práticas anticompetitivas ou emitir licenças compulsórias em situações excepcionais.

Privacidade e Proteção de Dados

Já quanto a privacidade e proteção de dados, a inovação tecnológica frequentemente depende do uso de grandes volumes de dados pessoais, especialmente em áreas como inteligência artificial e marketing digital.

A Constituição protege a privacidade no artigo 5º, inciso X, e a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018) regulamenta o tratamento de dados pessoais, estabelecendo limites claros para o uso ético e responsável dessas informações.

Empresas que inovam no uso de dados devem garantir que seus processos respeitem os direitos fundamentais, adotando medidas de transparência, segurança e consentimento dos titulares.

Desenvolvimento Socioeconômico

Um país que não se atente ao desenvolvimento socioeconômico da nação está fadado a um futuro com impactos sociais de grande monta, especialmente relacionados ao desemprego e alta taxa de inflação. A inovação tecnológica é um motor de crescimento econômico, e o Direito Constitucional Privado desempenha um papel importante na criação de um ambiente favorável à atividade empresarial.

A Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2019), por exemplo, busca reduzir a burocracia e aumentar a segurança jurídica para empreendedores, promovendo um ambiente mais propício à inovação.

Direitos do Consumidor

Por fim, as inovações tecnológicas devem ser compatíveis com os direitos dos consumidores, garantindo segurança, transparência e qualidade nos produtos e serviços oferecidos.

Tecnologias emergentes, como carros autônomos ou dispositivos conectados, levantam questões legais complexas sobre responsabilidade civil em caso de falhas, exigindo que o Direito Constitucional Privado ofereça respostas adequadas.

Desafios Contemporâneos para a Proteção da Inovação

Apesar do arcabouço jurídico existente, a proteção da inovação tecnológica enfrenta desafios contínuos, muitos deles decorrentes da rápida evolução das tecnologias e da globalização dos mercados.

A regulamentação adequada de tecnologias disruptivas, como inteligência artificial, blockchain e biotecnologia, desafia os limites do direito tradicional, de forma que exigem novas abordagens regulatórias.

A dificuldade em prever os impactos dessas tecnologias cria incertezas jurídicas que podem desestimular investimentos e inovações.

O Ritmo da Legislação e os Desafios da Propriedade Intelectual

Ademais, é notório que o Poder Legislativo atua em ritmo próprio, de forma que se mostra inviável a este acompanhar na mesma velocidade as tecnologias que vem sido desenvolvidas. Não obstante, a necessidade de equilibrar a proteção dos direitos de propriedade intelectual com o acesso a tecnologias essenciais é um tema recorrente.

No caso das vacinas contra a COVID-19, por exemplo, a pressão por uma suspensão temporária de patentes mostrou como a propriedade intelectual pode entrar em conflito com necessidades globais.

Conclusão

O Direito Constitucional Privado desempenha um papel crucial na proteção da inovação tecnológica, articulando os princípios constitucionais com as normas de Direito Privado para promover um ambiente jurídico equilibrado e seguro.

Por meio da proteção de direitos fundamentais, como propriedade intelectual, privacidade e liberdade econômica, e da regulação de novas tecnologias, o Direito busca fomentar a inovação enquanto protege os interesses coletivos e individuais.

No entanto, os desafios contemporâneos, como a rápida evolução tecnológica e os conflitos entre direitos concorrentes, exigem uma abordagem jurídica dinâmica e adaptativa. O fortalecimento do diálogo entre o Direito e a tecnologia, aliado à participação ativa de legisladores, juízes, empresas e a sociedade, será essencial para garantir que a inovação continue a ser uma força positiva no desenvolvimento humano, social e econômico.

Dessa forma, o Direito Constitucional Privado reafirma sua relevância como instrumento de proteção e promoção da inovação em benefício de toda a sociedade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBOSA, Mirele Alves; DE AMORIM, Adriano Portella. OS REFLEXOS JURÍDICOS DO DIREITO DE IMAGEM POST MORTEM NO TOCANTE À UTILIZAÇÃO DO DEEPFAKE (DIREITO). Repositório Institucional, v. 3, n. 1, 2024.

LÔBO, Edilene; MÓL, Ana Lúcia Ribeiro. O DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO ÀS INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS E A OMISSÃO DO ESTADO BRASILEIRO NA ADOÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA SUA PROTEÇÃO. Revista Direito UFMS, p. 146-165, 2022.

NAKAMOTO, Fabiano; BENFATTI, Fabio Fernandes Neves. DIREITO À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA: A LACUNA LEGISLATIVA ALGORÍTMICA COMO DESAFIO A SER SOLUCIONADO. Revista do Mestrado em Direito da UCB, p. 50-64, 2022.

Acompanhe de perto as novidades

Inscreva-se na nossa newsletter e receba todos os artigos em primeira mão!