Compliance é um dos assuntos mais relevantes na pauta de práticas que devem ser adotadas pelas empresas comprometidas com a aplicação de procedimentos de trabalho e gestão em conformidade com normas e legislação.
Assim, a compliance acaba contribuindo para que empresas consigam entender a importância de sua utilização em seus programas de controle e gestão. Mesmo que ainda se perceba uma falta de compreensão dos gestores sobre as condições técnicas para aplicação do compliance nas empresas.
Posto isso, o presente artigo busca trazer aos advogados e profissionais do direito o esclarecimento sobre os requisitos necessários para a implementação das práticas de compliance em empresas de diversos segmentos. Vamos lá?
O que é compliance?
O compliance é um termo da língua inglesa que deriva do verbo “to comply”, que se tornou uma grande “muleta” para quem precisa falar sobre conformidade. Trazendo para uma tradução livre da língua portuguesa, significa cumprir, obedecer e executar aquilo que se foi determinado.
Conformidade essa com leis e normas, que se traduzem em sua grande maioria com um código de conduta da empresa, que obviamente deve ser seguido, atrás de todas as políticas e procedimentos adotados por empresas. Lembrando que todo procedimento ali adotado é baseado nos princípios e valores que são admitidos pela referida empresa.
De fato, consiste no dever de promover uma cultura que estimule, em todos os membros da organização, desde gestores e operadores, a ética e o exercício do objeto social em conformidade com a lei.
A temática de compliance, embora seja uma velha conhecida ferramenta dos profissionais que atuam em conformidade, como agentes do controles internos e auditoria, por exemplo, ganharam ainda mais destaque nos últimos anos.
Isso porque, consequentemente houveram grandes escândalos no Brasil e no mundo, envolvendo a prática de corrupção e lavagem de dinheiro. A prática da compliance já é bastante utilizada em todo mundo, mas no Brasil iniciou-se de fato com a publicação da Lei n. 9.613/98 pelo Congresso Nacional.
Tal dispositivo dispõe sobre crimes de lavagem e ocultação de bens, a prevenção da utilização do Sistema Financeiro Nacional para os atos ilícitos previstos na referida lei, cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), a unidade de inteligência financeira brasileira, e o órgão integrante do Ministério da Fazenda.
Importante citar alguns marcos legais que contribuíram para que o compliance se consolidasse como um instrumento de ética e integridade nos negócios, a começar pela lei norte-americana Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), promulgada em 1977, que teve como propósito o controle do pagamento de propinas a funcionários públicos estrangeiros e dessa forma, com a tentativa de restaurar o mercado interno nos Estados Unidos.
É claro que o compliance tem forte relação frente ao combate à corrupção. Mas por outro lado, o compliance vai muito além, é sobre pessoas. São pautadas por decisões, de gestores ou colaboradores, que devem buscar pautar suas ações na responsabilidade corporativa, escolhendo sempre fazer o que é certo, até que este comportamento venha a se naturalizar.
São hipóteses de implementação do compliance:
- Implementação de novos produtos e serviços;
- Implementação de tecnologias;
- Nos sistemas de produção e distribuição;
- Nas relações com fornecedores, parceiros e clientes;
- Com o poder público, a sociedade e o meio ambiente.
Dessa forma, consiste em planejar a prevenção de riscos de desvios de conduta e descumprimento legal, além de incorporar métodos para detectá-los e controlá-los. Tudo isso por intermédio de um programa de compliance, que também é conhecido como programa de integridade.
Com isso, os impactos da implementação do programa são diversos, o compliance é capaz de promover:
- Redução de custos com passivos judiciais;
- Neutralização de riscos de sanções administrativas – por exemplo, autuações e multas;
- Planejamento e redução da carga tributária do negócio;
- Maior segurança jurídica nas relações comerciais com clientes, parceiros, fornecedores e stakeholders;
- Conquista de maior credibilidade e bom relacionamento com os órgãos de fiscalização;
- Proteção e melhoria da imagem institucional da empresa junto ao mercado, investidores e acionistas;
- Aumento da competitividade e lucratividade do negócio.
Compliance nas empresas públicas e privadas
A compliance pode ser utilizada tanto na iniciativa pública quanto na privada. Em empresas, costumeiramente mobilizam os gestores a uma postura mais proativa e preventiva no gerenciamento e no tratamento dos riscos que permeiam a atividade empresarial e comprometem sua sustentabilidade, tais como:
- Problemas trabalhistas;
- Problemas tributários;
- Autuações e sanções por parte da administração pública direta ou indireta;
- Danos ao patrimônio físico;
- Falhas em ferramentas de ti, sistemas e na segurança da informação armazenada e compartilhada;
- Falhas em contratações de clientes, parceiros e fornecedores;
- Fraudes e desvios financeiros por parte dos colaboradores que ocupam cargos de confiança e gestão;
- Corrupção de agentes públicos;
- Lavagem de dinheiro.
O compliance é um dos pilares da governança corporativa, juntamente com a confiança e transparência (disclosure); a equidade (fairness), sintetizada na lealdade dos administradores para com os interesses da companhia; e a prestação de contas (accountability).
Por derradeiro, se relaciona com a exposição pública das contas aos interessados em determinado negócio, além da responsabilização dos gestores e subordinados por qualquer ato ilícito praticado.
Responsabilidade no compliance
Inicialmente tratadas, no Brasil, dentro da realidade da Lei de Lavagem de Dinheiro original (Lei n. 9.613) as noções de criminal compliance passaram por profunda alteração, em especial após a entrada em vigor da Lei n. 12.683, a qual reestruturou toda a dinâmica relativa ao tratamento penal da lavagem de capitais.
Ademais, uma das principais novidades da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013) foi estabelecer hipóteses de responsabilidade objetiva para a pessoa jurídica envolvida em atos de corrupção.
As empresas são responsáveis pela criação de instrumentos de prevenção às irregularidades, bem como por reprimir os atos praticados em desacordo com as leis, sob pena de responsabilização objetiva e imposição de sanções rigorosas previstas no artigo 19 da Lei n. 12.846/2013, aplicadas proporcionalmente às condutas praticadas:
Art. 19. Em razão da prática de atos previstos no art. 5º desta Lei, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, por meio das respectivas Advocacias Públicas ou órgãos de representação judicial, ou equivalentes, e o Ministério Público, poderão ajuizar ação com vistas à aplicação das seguintes sanções às pessoas jurídicas infratoras:
I – perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;
II – suspensão ou interdição parcial de suas atividades;
III – dissolução compulsória da pessoa jurídica;
IV – proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos.
Diante disso, as sanções podem ser aplicadas de forma isolada ou cumulativa. O Ministério Público ou a Advocacia Pública ou órgão de representação judicial ou equivalente, do ente público poderá requerer a indisponibilidade de bens, direitos ou valores necessários à garantia do pagamento da multa ou da reparação integral do dano causado, conforme previsto no art. 7º, ressalvado o direito do terceiro de boa-fé.
Papel do advogado no compliance
O advogado possui forte apreço frente ao compliance, isso porque, o advogado é imprescindível para formular códigos de conduta em conformidade com leis e atos normativos. Dessa forma, percebe-se que quanto mais o advogado estiver em sintonia com o compliance e seus métodos de aplicação, melhor será a entrega.
Em diversas empresas, independente de ramo específico, é de grande valia que se tenha condutas pré determinadas, de forma documentada para apresentação a um possível cliente. Por isso, o papel do advogado é fundamental para uma produção segura desse documento, alinhado aos valores da empresa em comento.
Por exigir o conhecimento de uma complexa cadeia de normas regulatórias para as mais diversas atividades, o papel do advogado é muito importante. Nesse cenário, o advogado em compliance ganha destaque dentro das companhias de todos os segmentos no Brasil e no mundo, principalmente no sistema jurídico-econômico
O profissional de direito que se interessar pela área, deve buscar ampliar seus conhecimentos em temas extrajurídicos, como sistemas de auditorias e due diligence, administrativo, financeiro, contábil, entre outros.
Assim sendo, a capacitação do advogado em compliance é um requisito fundamental para uma efetiva orientação, identificação e elaboração do melhor programa a ser adaptado e operacionalizado no universo organizacional de cada empresa.
Referências
ASSI, Marcos. Compliance: como implementar. São Paulo: Trevisan, 2018.
Blog LEC. Saiba Definitivamente O Papel Do Advogado Em Compliance. Brasil, 2019.
LEI Nº 12.846, DE 1º DE AGOSTO DE 2013.
LEI Nº 12.683, DE 9 DE JULHO DE 2012.