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Liberdade de expressão na internet: até onde vai?

Em primeiro lugar, é certo que a Internet é uma revolução nos meios de comunicação: reduziu as fronteiras e mudou a aquisição e a construção do conteúdo. No entanto, tanto quanto a grandeza do impacto dela na tecnologia também surgiu a imensidão da temática: até onde vai a liberdade de expressão na internet?

Portanto, abordaremos aqui a liberdade de expressão na internet, sua relação com os direitos da personalidade e a tendência da jurisprudência nesse conflito. 

Qual a importância da liberdade de expressão?

Acima de tudo, a liberdade de expressão é um direito particularmente fundamental, básico, pois sua proteção é vital para a dignidade da pessoa e para a estrutura democrática do nosso país.

Analogamente, a Constituição prevê a liberdade de expressão no artigo 5º:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, liberdade, igualdade, segurança e a propriedade, nos termos seguintes: 

IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; 

VIII – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; 

IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. 

Entretanto, nenhuma garantia é absoluta, portanto, pode ser restringida quando conflitar com outra ou valores constitucionais. 

Nesse ponto, deve-se enfatizar que fatores necessários à integridade moral de outras pessoas e mesmo à segurança coletiva podem ser legalmente invocados para limitar o direito à liberdade de expressão.

E, assim, é importante revisitar os direitos da personalidade.

Direitos da Personalidade: o que são e qual sua importância?

Em síntese, eles são os direitos inatos à pessoa humana e às suas relações sociais. Tais prerrogativas pessoais inerentes ao ser humano são tão importantes que são protegidas pela doutrina e jurisprudência como direitos inalienáveis e indisponíveis.

Tais direitos da personalidade são também definidos pelo doutrinador Alberto Bittar como: 

“os direitos reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade, previstos no ordenamento jurídico exatamente para a defesa de valores inatos no homem, como a vida, a higidez física, a intimidade, o segredo, o respeito, a honra, a intelectualidade e outros tantos.” 

Aqui, muita atenção, pois se relaciona bastante com a nossa temática. Afinal, a garantia constitucional de proteção da intimidade, da vida privada, da honra, da imagem da pessoa e dos demais elementos inerentes à personalidade tem carga bastante valorativa no sistema legal.

Analogamente à previsão constitucional, o artigo 12, da Declaração Universal dos Direitos Humanos também afirma que:

“Ninguém será sujeito a interferências na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques” (UNESCO,1948).

Portanto, percebe-se que o direito da liberdade de expressão quando confronta com a esfera da intimidade de outra pessoa, isto é, direitos da personalidade, configura sim robusto ato. 

Nesse caso, passaremos a analisar então como ficam os direitos da personalidade em relação à liberdade de expressão.

O direito à liberdade de expressão é absoluto?

Primeiramente, o direito à liberdade de expressão não é absoluto. Todavia, acompanhamos o tremendo crescimento e expansão da Internet e também encontramos muitas expressões de opinião e troca de informações que incitam a violência, a intolerância e o abuso de poder. 

Como fica a liberdade de expressão na internet nesse cenário, afinal?

Certamente quando falamos em liberdade de expressão na Internet, encontramos outros direitos que devem ser considerados: direito à vida, à intimidade, à igualdade, à segurança, à propriedade, isto é, direitos da personalidade, vistos anteriormente.

Assim, a famigerada liberdade de expressão que agredir outro cidadão pode ser contida e reprimida, pois como visto a liberdade de expressão não é um direito absoluto, ainda mais quando se torna uma ameaça atroz aos direitos da personalidade. 

Em suma, é importante também notar que quando ocorre um conflito de direitos básicos, o peso desses direitos serve como uma força motriz para o equilíbrio dentro do sistema legal, buscando um processo de balanceamento pela carga valorativa do direito no caso.

Portanto, a liberdade de expressão pode ser restrita e não pode ser exercida de forma abusiva para prejudicar os direitos de terceiros.

Ademais, vejamos jurisprudência sobre a temática:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO CIVIL. RETIRADA DE PUBLICAÇÃO DA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES (INTERNET). DIVULGAÇÃO DE IMAGENS E TEXTOS COM EXPRESSÕES AGRESSIVAS E DESRESPEITOSAS. PONDERAÇÃO. DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE DE EXPRESSÃO VS. DIREITO FUNDAMENTAL À INTIMIDADE. PREVALÊNCIA DESTE ÚLTIMO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO. ABUSO DE DIREITO. VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE. RECURSO PROVIDO. 

1. O alcance legítimo do direito fundamental à liberdade de expressão (art. 5º, inc. IX, da Constituição Federal) deve ser ponderado em contraposição à garantia constitucional de proteção da intimidade, da vida privada, da honra, da imagem da pessoa (art. 5º, inc. X, da Constituição Federal) e dos demais elementos ínsitos à personalidade. 

2. A publicação que veicula texto redigido de forma a atingir a esfera da intimidade de outra pessoa configura abuso do direito à liberdade de expressão. Nesse caso em especial, merece prestígio o direito fundamental à intimidade em detrimento da liberdade de expressão. 3. Recurso conhecido e provido.

(TJ-DF 07168381520178070000 DF 0716838-15.2017.8.07.0000, Relator: ALVARO CIARLINI, Data de Julgamento: 11/04/2018, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 23/04/2018 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

Considerações finais sobre a liberdade de expressão na internet

Em primeiro momento, ressalta-se que a liberdade de expressão é um direito particularmente fundamental, pois sua proteção é essencial para a dignidade da pessoa e para a estrutura democrática do nosso país.

Em segundo momento, é importante perceber que quando se fala em liberdade de expressão na internet certamente se entrelaçam garantias constitucionais da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem da pessoa humana.

Portanto, como o direito à liberdade de expressão não é absoluto, ele pode ser contido quando atenta contra direito fundamental de outro cidadão. Conforme mostra também jurisprudência. 

É imprescindível, dessa forma, que qualquer pessoa que de fato entenda o que a lei dispõe sobre a liberdade de expressão atue como fiscal na observância da convivência pacífica entre o direito da liberdade de expressão na internet e o respeito às garantias da personalidade. 

Embasamentos jurídicos que podem ser úteis na sua petição

  1. Constituição Federal, art. 5º, inciso X:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…)

X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

  1. Código Civil, art. 186:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

  1. Jurisprudência:

Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça: “o dano moral alcança prevalentemente valores ideais, não goza apenas a dor física que geralmente o acompanha, nem se descaracteriza quando simultaneamente ocorrem danos patrimoniais, que podem até consistir numa decorrência de sorte que as duas modalidades se acumulam e tem incidências autônomas.”

RECURSO INOMINADO. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMAGEM DISPONIBILIZADA EM VÍDEO PUBLICADO NA REDE SOCIAL FACEBOOK, COM NÍTIDA CONOTAÇÃO ERÓTICA. RÉ QUE, NOTIFICADA, DEIXA DE EXCLUIR O CONTEÚDO (ART. 21 DA LEI Nº 12965/14). VIOLAÇÃO A DIREITO DA IMAGEM, COM PROTEÇÃO LEGAL (ART. 20, CAPUT, DO CC) E CONSTITUCIONAL (ART. 5º, X DA CF/88). DANO MORAL EVIDENCIADO. (…) O administrador de rede social que, notificado da publicação de conteúdo com cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado sem autorização, ainda assim não promove o bloqueio ou a exclusão do material, viola direito da personalidade, cometendo, em consequência, ato ilícito passível de compensação financeira. (…)(TJ-SC – RI: 03211083020158240038 Joinville 0321108-30.2015.8.24.0038, Relator: Luís Paulo Dal Pont Lodetti, Data de Julgamento: 10/04/2019, Quinta Turma de Recursos – Joinville)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO CIVIL. RETIRADA DE PUBLICAÇÃO DA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES (INTERNET). DIVULGAÇÃO DE IMAGENS E TEXTOS COM EXPRESSÕES AGRESSIVAS E DESRESPEITOSAS. PONDERAÇÃO. DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE DE EXPRESSÃO VS. DIREITO FUNDAMENTAL À INTIMIDADE. PREVALÊNCIA DESTE ÚLTIMO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO. ABUSO DE DIREITO. VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. O alcance legítimo do direito fundamental à liberdade de expressão (art. 5º, inc. IX, da Constituição Federal) deve ser ponderado em contraposição à garantia constitucional de proteção da intimidade, da vida privada, da honra, da imagem da pessoa (art. 5º, inc. X, da Constituição Federal) e dos demais elementos ínsitos à personalidade. 2. A publicação que veicula texto redigido de forma a atingir a esfera da intimidade de outra pessoa configura abuso do direito à liberdade de expressão. Nesse caso em especial, merece prestígio o direito fundamental à intimidade em detrimento da liberdade de expressão. 3. Recurso conhecido e provido. (TJ-DF 07168381520178070000 DF 0716838-15.2017.8.07.0000, Relator: ALVARO CIARLINI, Data de Julgamento: 11/04/2018, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 23/04/2018 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

  1. Doutrina:

Assim como o homem tem direito à integridade de seu corpo e de seu patrimônio econômico, tem-no igualmente à indenidade do seu amor-próprio (consciência do próprio valor moral e social, ou da própria dignidade ou decoro) e do seu patrimônio moral.” (CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 288).

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