Nos últimos anos, os criptoativos e a tecnologia blockchain emergiram como inovações disruptivas no cenário financeiro global. Como resultado, essas tecnologias não apenas introduziram novas formas de transações e investimentos, mas também desafiaram estruturas jurídicas tradicionais. Dessa forma,os profissionais do direito precisam se adaptar continuamente e desenvolver novas competências.
Neste artigo você vai encontrar uma visão geral sobre os criptoativos e a tecnologia blockchain, explorando seus possíveis impactos jurídicos e as habilidades essenciais que os advogados devem adquirir para atuar eficazmente nesse campo em constante evolução.
O que são Criptoativos e Criptomoedas?
De maneira geral, os criptoativos, conhecidos no contexto regulatório brasileiro como “ativos virtuais”, podem ser definidos como “representações digitais de valores ou direitos que podem ser transferidos e armazenados eletronicamente”. Dentro desta categoria, existem várias espécies de criptoativos, utilizados para diversas funções, como as criptomoedas, os tokens e os NFTs (Tokens não fungíveis).

Criptomoedas
Por outro lado, as criptomoedas podem ser definidas como um “dinheiro” digital descentralizado. Isso significa que, diferentemente das moedas tradicionais emitidas por autoridades centrais, como bancos centrais ou governos, as criptomoedas operam em sistemas descentralizados baseados na tecnologia blockchain.
As criptomoedas possuem diversas características próprias que as diferenciam de outros ativos financeiros. Entre essas características, destacam-se:
- Descentralização: Não há uma autoridade central controlando a moeda; as transações são verificadas por uma rede distribuída de computadores.
- Transparência: Todas as transações são registradas em um “livro-razão” público, a blockchain, acessível a qualquer pessoa.
- Segurança: A criptografia avançada é capaz de oferecer uma camada de proteção das transações e as carteiras digitais contra fraudes e ataques cibernéticos, o que não significa que estes não aconteçam.
- Pseudoanonimato: Embora muitos acreditem que as transações com criptoativos são totalmente anônimas, na prática, as transações em blockchain são públicas e os endereços envolvidos podem ser rastreados.
Bitcoin
O Bitcoin, lançado em 2008 por Satoshi Nakamoto, é a criptomoeda mais conhecida e, por conseguinte, a mais popular. Contudo, já existe uma diversidade de criptomoedas disponível no mercado para diferentes perfis de uso. Inclusive, diversos governos pelo mundo, como o governo dos Estados Unidos, tem anunciado medidas de criação de reservas estratégicas em criptomoedas.
Entre as mais conhecidas podemos mencionar:
- Bitcoin (BTC): Criada em 2008, é a primeira e mais conhecida criptomoeda, frequentemente referida como “ouro digital” devido ao seu valor de mercado e aceitação global.
- Ethereum (ETH): Introduzida em 2015, além de funcionar como uma moeda digital, também permite a criação e execução de contratos inteligentes e aplicativos descentralizados.
- Solana (SOL): Lançada em 2020 na blockchain de mesmo e cujo protocolo foi desenvolvido para oferecer maior escalabilidade e facilitar a criação de aplicativos descentralizados.
O que é a Tecnologia Blockchain?
A blockchain, como o próprio nome sugere, é uma cadeia de blocos, que funciona como um “livro-razão” digital distribuído e imutável que registra todas as transações de forma transparente e segura.
Basicamente, a blockchain é composta por blocos interligados, sendo que cada bloco contém um indentificador único chamado hash. Dessa forma, qualquer alteração em um bloco exigiria mudanças em todos os blocos subsequentes, tornando o sistema extremamente seguro e resistente a fraudes.
No caso de transações com criptomoedas, cada bloco na cadeia contém um conjunto de transações com as informações como os valores, endereços e carteiras associados com a transação. Uma vez registrado, esse bloco não pode ser alterado sem o consenso da rede. Essa estrutura garante a integridade e a confiabilidade dos dados, eliminando a necessidade de intermediários.
De uma forma bem resumida, a criação de blocos e, uma blockchain funciona da seguinte maneira:
- Transação: Uma transação é iniciada por um usuário e transmitida para a rede.
- Verificação: A rede de computadores (nós) verifica a validade da transação usando algoritmos de consenso, como Proof of Work ou Proof of Stake.
- Agrupamento em Blocos: Transações verificadas são agrupadas em um bloco.
- Adição à Cadeia: O bloco é adicionado à cadeia existente de blocos, formando uma sequência cronológica e imutável.
Como resultado, as principais características de uma blockchain são:
- Imutabilidade: Uma vez adicionadas, as informações não podem ser alteradas ou excluídas, garantindo a integridade dos dados.
- Transparência: Todos os participantes têm acesso às mesmas informações, promovendo confiança e verificabilidade.
- Segurança: A estrutura descentralizada e os mecanismos criptográficos dificultam ataques e fraudes.
Impactos Jurídicos das Criptomoedas e da Tecnologia Blockchain
A ascensão das criptomoedas e da tecnologia blockchain apresenta uma série de desafios e oportunidades para o campo jurídico. A seguir, exploramos alguns dos principais impactos nessas áreas.
Desafios Regulatórios
A natureza inovadora e descentralizada das criptomoedas e da tecnologia blockchain desafia os sistemas legais tradicionais, que geralmente dependem de entidades centralizadas para regulamentação e supervisão. Por isso, questões como a definição legal das criptomoedas, sua classificação como ativos financeiros e a aplicação de leis existentes são temas de intenso debate jurídico, e inclusive foram objeto de consultas públicas recentes pelo Banco Central e a Receita Federal.
Entre os principais desafios em debate podemos listar, não exaustivamente:
- Classificação Legal: Determinar se as criptomoedas devem ser tratadas como moedas, commodities, valores mobiliários ou uma nova categoria de ativos.
- Tributação: Estabelecer diretrizes claras sobre como as transações com criptomoedas devem ser tributadas, incluindo ganhos de capital e impostos sobre vendas.
- Conformidade: Garantir que as plataformas de negociação e outros intermediários cumpram as leis de combate à lavagem de dinheiro (AML) e conheça seu cliente (KYC).
No Brasil, a ausência de regulamentações mais específicas, além da Lei nº 14.478 (conhecida como Marco legal das criptomoedas), para criptomoedas tem levado a interpretações variadas e à necessidade de adaptações das normas existentes para abarcar essas novas tecnologias. Por exemplo, a Receita Federal exige que os contribuintes declarem suas operações com criptoativos, mas ainda há lacunas e ambiguidades que precisam ser abordadas pela legislação.
Contratos Inteligentes
Um dos principais casos de uso da tecnologia blockchain é a possibilidade de criação de contratos inteligentes (smart contracts), que são programas autoexecutáveis com os termos do acordo diretamente escritos em código. Esses contratos são automaticamente executados quando as condições predefinidas são atendidas, eliminando a necessidade de intermediários e aumentando a eficiência.
Entre as possíveis implicações dos smart contracts cabe mencionar:
- Validade Legal: Determinar se os contratos inteligentes atendem aos requisitos legais tradicionais de formação de contratos, como oferta, aceitação e consideração.
- Jurisdicionalidade: Estabelecer qual jurisdição se aplica a contratos que operam em uma rede global descentralizada.
- Execução e Recursos: Definir mecanismos para resolver disputas e aplicar recursos legais quando um contrato inteligente não funciona conforme o esperado.
Crimes Financeiros e Compliance
A pseudo-anonimidade proporcionada pelas criptomoedas dá impressão que pode facilitar atividades ilícitas, como lavagem de dinheiro e evasão fiscal. Isso exige que os profissionais do direito que desenvolvam estratégias de compliance e políticas de Know Your Customer (KYC) para mitigar riscos e garantir a conformidade com as leis existentes.
Habilidades necessárias para Profissionais do Direito
O mercado dos criptoativos está em ascensão e já é uma realidade, contando com diversas oportunidades para profissionais de diversas áreas, inclusive profissionais do Direito. Para atuar eficazmente nesse novo cenário, os profissionais do direito que tenham interesse devem se atentar às seguintes competências:
- Conhecimento Técnico: Compreender os fundamentos da tecnologia blockchain e o funcionamento das criptomoedas.
- Atualização Regulatória: Manter-se informado sobre as mudanças nas legislações nacionais e internacionais relacionadas a criptoativos.
- Conhecimento de Compliance: Um caminho para profissionais interessados é desenvolver atuar na área de compliance, desenvolvendo e implementando mecanismos conformidade que atendam às novas exigências legais.
- Capacidade de Adaptação: Estar preparado para lidar com a rápida evolução tecnológica e suas implicações jurídicas.

Considerações Finais
As criptomoedas e a tecnologia blockchain estão transformando o mundo jurídico, introduzindo novos desafios e oportunidades. Por isso, a área tem oportunidades e precisa de profissionais do Direito qualificados para lidar e atuar frente às rápidas mudanças tecnológicas e às discussões regulatórias em andamento não só no Brasil como em todo o mundo.
Assim, profissionais do direito e demais áreas que buscam se destacar nesse campo devem investir em educação contínua e desenvolvimento de competências específicas para navegar com sucesso nesse ambiente em constante mudança.

Referências:
AMAZON WEB SERVICES. O que é blockchain? Disponível em: https://aws.amazon.com/pt/what-is/blockchain/. Acesso em: 11 mar. 2025.
BANCO DE PORTUGAL. Criptoativos: o que são. Disponível em: https://clientebancario.bportugal.pt/pt-pt/criptoativos-o-que-sao. Acesso em: 11 mar. 2025.
COINEXT. O que é Solana (SOL) e como funciona essa moeda? Disponível em: https://coinext.com.br/criptomoedas/solana. Acesso em: 11 mar. 2025.
CNN BRASIL. Banco Central lança consulta pública sobre regulamentação de ativos virtuais. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/banco-central-lanca-consulta-publica-sobre-regulamentacao-de-ativos-virtuais/. Acesso em: 11 mar. 2025.
IBM. O que é blockchain? Disponível em: https://www.ibm.com/br-pt/topics/blockchain. Acesso em: 11 mar. 2025.
INFOMONEY. O que são criptomoedas e como investir com segurança? Disponível em: https://www.infomoney.com.br/guias/criptomoedas/. Acesso em: 11 mar. 2025.
INFOMONEY. O que são smart contracts e qual a relação com criptomoedas? Disponível em: https://www.infomoney.com.br/guias/smart-contracts/. Acesso em: 11 mar. 2025.
INVESTOPEDIA. What is a hash? Hash functions and cryptocurrency mining. Disponível em: https://www.investopedia.com/terms/h/hash.asp. Acesso em: 11 mar. 2025.
REUTERS. Trump signs order to establish strategic bitcoin reserve. Disponível em: https://www.reuters.com/technology/trump-signs-order-establish-strategic-bitcoin-reserve-white-house-crypto-czar-2025-03-07/. Acesso em: 11 mar. 2025.
SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DO BRASIL. Receita Federal esclarece sobre declaração de operações com criptoativos. Disponível em: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/noticias/2023/marco/receita-federal-esclarece-sobre-declaracao-de-operacoes-com-criptoativos. Acesso em: 11 mar. 2025.
UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA. Afinal, as criptomoedas vieram mesmo para ficar. Disponível em: https://www.clsbe.lisboa.ucp.pt/noticias/afinal-criptomoedas-vieram-mesmo-para-ficar. Acesso em: 11 mar. 2025.