Na nossa série sobre Direitos Humanos no Blog do IDP, estudamos sobre o status hierárquico que os tratados e convenções sobre Direitos Humanos possuem no sistema jurídico brasileiro.
Também exploramos dois mitos sobre Direitos Humanos que precisam ser desconstruídos: (i) Direitos Humanos não são para beneficiar infratores da lei, e (ii) Direitos Humanos não servem para aniquilar a soberania estatal.
Mencionamos também que o Direito Internacional dos Direitos Humanos oferece um mecanismo de proteção à dignidade da pessoa humana.
Na verdade, não um, mas múltiplos, que mantêm diálogo entre si. Algumas vezes eles citam uns aos outros como fontes interpretativas, outras vezes trocando boas práticas, e ainda empreendendo iniciativas conjuntas.
Nesse texto, vamos abordar o Sistema Global de Proteção de Direitos Humanos, e duas subdivisões do Sistema Regional o Europeu e o Africano.
Vamos lá!
Direitos Humanos em Sistema Global: podemos falar em direitos universais?
O sistema global de direitos humanos é composto por um conjunto de normas, tratados, acordos e mecanismos internacionais que visam promover e proteger os Direitos Humanos em todo o mundo.
Ele se baseia na ideia de que os Direitos Humanos são universais, indivisíveis e interdependentes, e devem ser respeitados por todos os países e governos.
Esse sistema, que consolidou o processo de internacionalização dos Direitos Humanos, é liderado pela Organização das Nações Unidas (ONU), que estabeleceu diversos órgãos e tratados internacionais para proteger os Direitos Humanos. Por esse motivo é também conhecido como onusiano.
Entre os principais tratados estão a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
Além disso, há diversos órgãos e mecanismos internacionais que trabalham para monitorar e garantir o cumprimento desses tratados pelos países.
O instrumento base do sistema onusiano é a própria Carta da ONU, adotada em 1945 na cidade de São Francisco, nos Estados Unidos. A Carta estabelece os objetivos, a composição e a estrutura da organização, incluindo seus principais órgãos.
Entre eles estão o Conselho de Direitos Humanos da ONU, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e os comitês responsáveis por monitorar a implementação dos tratados.
As ações da ONU se organizam com base em três pilares:
- a manutenção da paz e segurança internacionais;
- a proteção aos direitos humanos; e
- a promoção do desenvolvimento.
Outros focos adicionais importantes são (i) zelar pelo Direito Internacional e (ii) prover auxílio humanitário para pessoas afetadas por desastres naturais ou fenômenos provocados pela própria humanidade, como guerras.
O sistema global de Direitos Humanos é fundamental para garantir que os direitos humanos sejam respeitados em todo o mundo e para proteger as pessoas contra violações e abusos.
A Declaração Universal de Direitos Humanos foi adotada em 10 de dezembro de 1948 em Paris é marco da internacionalização e da centralidade da dignidade humana. Traz consigo os princípios da universalidade, interdependência e indivisibilidade dos direitos.
Ela consolida o consenso internacional a respeito da noção de direitos humanos, e preenche de conteúdo as obrigações abertas estabelecidas pela Carta da ONU. Flávia Piovesan, professora do IDP, a considera como a base, ou pedra angular, do vasto sistema desenvolvido a partir de então.
O documento é composto por um preâmbulo e 30 artigos que estabelecem os direitos e liberdades fundamentais que devem ser protegidos e respeitados por todos os Estados membros das Nações Unidas.
É a primeira declaração universal que reconhece que todos os seres humanos têm direitos inalienáveis, independentemente de sua raça, cor, religião, gênero, idioma ou qualquer outra condição.
Os direitos incluem, entre outros, o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal, à liberdade de opinião e expressão, à liberdade de reunião e associação pacífica, à igualdade perante a lei e à proteção contra a discriminação.
A Declaração afirma já no artigo 1° que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. Por ser sistema universal, ela pretende proteger todas as pessoas, independente do país e do contexto em que se encontram.
A Declaração não é um tratado legalmente vinculativo, mas é uma expressão poderosa da vontade da comunidade internacional de proteger e promover os direitos humanos e fundamentais de todas as pessoas.
Desde a sua adoção, ela tem servido como um guia para a elaboração de leis nacionais e internacionais de Direitos Humanos, bem como para a ação dos governos e organizações internacionais em todo o mundo.
Sistemas Regionais de Direitos Humanos: considerando as especificidades de cada região
Os Sistemas Regionais são divididos em Europeu, Africano e Interamericano. Eles oferecem maior proteção a direitos específicos compartilhados por países de mesmo entorno geográfico em razão de sua proximidade e condições locais.
Nesse texto, vamos nos dedicar ao Europeu e Africano.
Sistema Europeu de Direitos Humanos
O Sistema Europeu de Direitos Humanos refere-se ao conjunto de instrumentos e órgãos encarregados de proteger e promover os Direitos Humanos na Europa. É composto por vários tratados internacionais, incluindo a Convenção Europeia dos Direitos Humanos e seus protocolos adicionais, e pelos órgãos responsáveis pela sua aplicação, incluindo o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
A Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que entrou em vigor em 1953, estabelece uma série de direitos fundamentais, incluindo o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal, à liberdade de expressão, à liberdade de pensamento, de consciência e de religião, e o direito a um julgamento justo.
Os protocolos adicionais abordam questões específicas, como a abolição da pena de morte e a proteção dos direitos sociais e econômicos.
O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, com sede em Estrasburgo, França, é o principal órgão responsável pela aplicação da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
O Tribunal é composto por juízes de cada Estado membro do Conselho da Europa e tem a competência de examinar petições individuais de violações dos direitos humanos. Suas decisões têm caráter vinculativo para os Estados membros e podem levar à condenação dos Estados que violam os Direitos Humanos.
Além disso, a União Europeia tem seu próprio Sistema de Proteção dos Direitos Humanos, que é composto pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e pela jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia.
A Carta dos Direitos Fundamentais estabelece uma série de direitos e princípios fundamentais, incluindo a dignidade humana, a liberdade, a igualdade, a não discriminação e o direito a um julgamento justo.
O Tribunal de Justiça da União Europeia tem a competência de examinar a conformidade das leis da União Europeia com a Carta dos Direitos Fundamentais.
Sistema Africano de Direitos Humanos
O Sistema Africano de Direitos Humanos é o mais recente. Ele se refere ao conjunto de instituições e mecanismos criados pela União Africana para promover e proteger os direitos humanos na África.
O sistema é composto por diversos tratados e convenções, como a Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, que estabelecem os direitos e liberdades fundamentais reconhecidos pelos países africanos.
Entre os principais órgãos do Sistema Africano de Direitos Humanos estão a Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, a Corte Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e o Comitê Africano dos Direitos e Bem-Estar da Criança.
Eles têm a responsabilidade de receber denúncias de violações de Direitos Humanos, conduzir investigações e tomar medidas para garantir que as vítimas sejam protegidas e que as violações sejam reparadas.
O início do Sistema se deu em razão da necessidade que os países africanos tinham de promover a sua autodeterminação, ou seja, a garantia de que cada povo possa governar a si mesmo, sem intervenções externas, respeitando suas diversidades culturais e tradições históricas.
Outro motivo foi auxiliar esses países no processo de descolonização e promover a cooperação internacional para atuar na economia global.
Por ser o mais recente dos Sistemas Regionais, alguns o consideram o menos avançado na sua estrutura. No entanto, na Carta Africana são previstos direitos civis, políticos, econômicos, culturais e sociais, enquanto as cartas dos demais Sistemas Regionais previam inicialmente apenas direitos civis e políticos.
Outro diferencial da Carta Africana é a importância consagrada aos direitos coletivos, e não apenas aos individuais. Já no preâmbulo declara que o respeito dos direitos dos povos deve necessariamente garantir os Direitos Humanos.
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Referências
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
MAZZUOLI, Valerio. C controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 4. ed. São Paulo: RT, 2016.
PIOVESAN, Flávia. Curso de Direitos Humanos: Sistema Interamericano. São Paulo: Grupo GEN, 2021.