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Tempo de leitura: 8 min

Litigância Climática: O Papel do Direito na Transição para uma Economia de Baixo Carbono

Redator: Matheus Carvalho

A crise climática é um dos maiores desafios do século XXI, afetando não apenas o meio ambiente, mas também a economia, a política e a sociedade como um todo. Nesse cenário, a transição para uma economia de baixo carbono tornou-se prioridade, exigindo ações coordenadas entre governos, empresas e a sociedade civil.

Diante desse cenário, o direito desempenha um papel fundamental nessa transição, atuando como um instrumento para garantir a implementação de políticas climáticas eficazes, incentivar práticas empresariais sustentáveis e assegurar a responsabilidade ambiental por meio da litigância climática. 

Mas, afinal, o que é litigância climática e como ela se conecta à agenda ESG (Environmental, Social, and Governance)?

O que é Litigância Climática?

A litigância climática refere-se a ações judiciais e outros mecanismos legais utilizados para pressionar governos e empresas a tomarem medidas mais rigorosas contra as mudanças climáticas. Esses processos podem ser movidos por indivíduos, organizações não governamentais (ONGs), comunidades afetadas ou mesmo investidores preocupados com os riscos climáticos.

Na prática, a litigância climática busca responsabilizar aqueles que contribuem para a crise climática, seja por omissão ou por ações que agravam o problema, como emissões excessivas de gases de efeito estufa (GEE). Além disso, a litigância climática também desempenha um papel essencial na criação de precedentes jurídicos que fortalecem as políticas de sustentabilidade.

O Direito e a Economia de Baixo Carbono

Uma economia de baixo carbono é baseada em práticas que minimizam as emissões de GEE, priorizando o uso de energias renováveis, a eficiência energética e a preservação de recursos naturais. Para alcançar esse modelo econômico, é essencial que existam marcos regulatórios que incentivem e garantam a transição.

Nesse sentido, o direito ambiental tem sido um dos principais aliados nesse processo, com legislações que promovem o desenvolvimento sustentável e estabelecem metas de redução de emissões. No Brasil, por exemplo, a Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº 12.187/2009) define diretrizes para mitigar os impactos das mudanças climáticas e integrar o país em uma economia global de baixo carbono.

No entanto, a implementação dessas políticas depende de mecanismos legais robustos, que garantam sua aplicação e penalizem o descumprimento. É aqui que entra a litigância climática, como uma ferramenta para monitorar e exigir a responsabilidade ambiental de empresas e governos.

O Papel do ESG na Transição Climática

A agenda ESG (Environmental, Social, and Governance) tem ganhado força como um critério essencial para avaliar a sustentabilidade e a responsabilidade das empresas. No contexto climático, o pilar ambiental (E) da ESG é diretamente ligado à economia de baixo carbono, incentivando práticas empresariais alinhadas com as metas globais de redução de emissões.

A integração do ESG nas estratégias corporativas também reduz riscos jurídicos, já que empresas alinhadas com padrões ambientais têm menos probabilidade de enfrentar processos por danos ao meio ambiente. Além disso, a transparência nas práticas ESG fortalece a confiança de investidores, consumidores e outros stakeholders, criando uma vantagem competitiva no mercado.

Casos de Litigância Climática no Brasil e no Mundo

No cenário internacional, a litigância climática tem gerado decisões de grande impacto. Um exemplo paradigmático é o caso Urgenda Foundation vs. Netherlands, em que a Suprema Corte da Holanda, em 2019, ordenou que o governo reduzisse as emissões de gases de efeito estufa (GEE) em pelo menos 25% até o final de 2020, com base nos níveis de 1990. Essa decisão foi pioneira, marcando a primeira vez que um tribunal obrigou um Estado a adotar medidas efetivas contra as mudanças climáticas.

A decisão da Suprema Corte destacou a aplicação do princípio da precaução e enfatizou a responsabilidade intergeracional. Foi reconhecido que as emissões antrópicas não mitigadas representam uma ameaça às gerações presentes e futuras. O tribunal também utilizou a Convenção Europeia dos Direitos Humanos para justificar que cada país deve assumir a responsabilidade de contribuir para o combate ao aquecimento global.

No Brasil, embora a litigância climática esteja em um estágio inicial, avanços significativos têm sido registrados. Ações judiciais relacionadas ao Fundo Amazônia e à fiscalização ambiental demonstram o papel crescente do Judiciário na proteção de recursos naturais. Essas ações mostram como a litigância climática pode ser um instrumento poderoso para fortalecer o cumprimento de compromissos ambientais assumidos pelo país.

Tribunais brasileiros também têm adotado abordagens inovadoras para responsabilizar governos e empresas por danos ambientais. A teoria da causalidade alternativa, por exemplo, tem sido utilizada para ampliar a responsabilização de poluidores, incluindo aqueles que contribuem para o desmatamento e as emissões de GEE. Inspiradas em precedentes internacionais, essas iniciativas reforçam a aplicação do Acordo de Paris e promovem a transição para uma economia de baixo carbono.

Desafios da Litigância Climática

Embora a litigância climática seja uma ferramenta poderosa, ela enfrenta desafios significativos. Entre os principais, destacam-se:

  1. Dificuldade na mensuração de danos: a relação direta entre ações humanas específicas e eventos climáticos pode ser difícil de comprovar.
  2. Complexidade técnica: processos relacionados ao clima frequentemente envolvem dados científicos complexos, exigindo a colaboração de especialistas.
  3. Resistência política e econômica: governos e empresas podem ser relutantes em implementar mudanças significativas devido a custos iniciais elevados.

Esses desafios não são exclusivos de um único país; eles refletem a complexidade de proteger o meio ambiente em um mundo cada vez mais interconectado. A intensificação das relações globais exige uma abordagem jurídica robusta que contemple questões transfronteiriças e promova a responsabilidade compartilhada por danos ambientais, respeitando as especificidades de cada nação.

Nesse contexto, a atuação de órgãos internacionais e fóruns multilaterais é essencial para enfrentar esses desafios. Eles desempenham um papel crucial ao promover a cooperação entre nações, unindo esforços e integrando conhecimentos jurídicos, científicos e econômicos para criar soluções eficazes e sustentáveis.

Para aprofundar essa discussão, o artigo “Os Desafios da Proteção do Meio Ambiente em um Mundo Globalizado”, disponível no Blog do IDP, analisa as dinâmicas entre globalização e proteção ambiental, destacando também o papel fundamental dos advogados e profissionais do direito na mediação de conflitos e na formulação de políticas globais mais sustentáveis.

Como o Direito pode Contribuir na Transição?

O direito dispõe de um conjunto robusto de ferramentas que podem atuar como catalisadores na transição para uma economia de baixo carbono. Essas ferramentas não apenas aceleram o processo, mas também garantem que ele seja conduzido de forma legítima, abrangente e sem a exclusão de etapas essenciais. Entre os mecanismos disponíveis, destacam-se:

  • Regulação ambiental: estabelecer normas claras para emissões de GEE e incentivar o uso de energias renováveis.
  • Tributação verde: criar incentivos fiscais para empresas sustentáveis e penalizar práticas poluentes.
  • Contratos verdes: incorporar cláusulas de sustentabilidade em contratos empresariais e governamentais.
  • Apoio a iniciativas ESG: incentivar empresas a adotarem práticas alinhadas aos critérios ESG.

Ao alinhar políticas públicas e instrumentos jurídicos, o direito pode criar um ambiente propício para o crescimento de uma economia mais sustentável.

A Conexão entre Direito, ESG e Economia de Baixo Carbono

A litigância climática é apenas uma das formas como o direito contribui para a transição climática. No entanto, seu impacto vai além das cortes judiciais, incentivando mudanças estruturais em empresas e governos. Ao conectar direito e ESG, criam-se incentivos para que as organizações assumam um papel ativo na mitigação da crise climática.

Empresas que integram critérios ESG em suas estratégias reduzem riscos e contribuem para uma economia global mais resiliente. Isso reflete diretamente em uma economia de baixo carbono, onde a sustentabilidade não é apenas uma obrigação, mas uma oportunidade de crescimento.

Considerações Finais

A transição para uma economia de baixo carbono exige um esforço coletivo, no qual o direito desempenha um papel essencial. Por meio da litigância climática, da regulação ambiental e do incentivo a práticas ESG, é possível criar um ambiente favorável para a mitigação das mudanças climáticas e a promoção do desenvolvimento sustentável.

Para advogados, empresários e gestores públicos, entender o papel do direito na agenda climática é essencial para enfrentar os desafios do século XXI. Afinal, construir um futuro sustentável depende de ações concretas e colaborativas entre todos os setores da sociedade.

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Referências

WEDY, Gabriel Tedesco. O ‘caso Urgenda’ e as lições para os litígios climáticos no Brasil. Conjur, 2 jan. 2021. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-jan-02/ambiente-juridico-urgenda-licoes-litigios-climaticos-brasil/. 

TEIXEIRA, Izabella; TONI, Ana. A crise ambiental-climática e os desafios da contemporaneidade: o Brasil e sua política ambiental. CEBRI-Revista. Policy Papers, nº 1, jan.-mar. 2022. Centro Brasileiro de Relações Internacionais. Disponível em: https://cebri.org/revista/br/artigo/21/a-crise-ambiental-climatica-e-os-desafios-da-contemporaneidade-o-brasil-e-sua-politica-ambiental.

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