Os data centers deixaram de ser apenas estruturas de tecnologia da informação para se tornarem a espinha dorsal da sociedade digital. Hospitais, tribunais, sistemas de segurança pública e administração tributária dependem diretamente deles.
Por isso, cresce o debate jurídico sobre tratá-los como infraestrutura essencial, exigindo regras claras de regulação, sustentabilidade e soberania digital para garantir eficiência, segurança e interesse público.

O papel dos data center na sociedade digital
Os data centers são instalações físicas ou virtuais que abrigam servidores, sistemas de armazenamento e de rede, além de infraestrutura elétrica e de resfriamento, responsável pelo armazenamento, processamento e distribuição de dados essenciais para diversos setores.
Importância para serviços públicos
Essas estruturas formam a espinha dorsal da sociedade digital, sustentando serviços como prontuários eletrônicos em hospitais, sistemas judiciais e administrativos em tribunais, bases de segurança pública e dados tributários governamentais. A interrupção desses centros pode comprometer operações essenciais e prejudicar o atendimento à população.
Comparação com setores essenciais de infraestrutura tradicionais
Modernamente, data centers têm sido reconhecidos como infraestrutura essencial, equiparando-se a setores como energia, água, transportes e telecomunicações. Diferentemente dessas infraestruturas físicas, os centros de dados demandam alta densidade tecnológica, conectividade e eletricidade redundante, além de questões específicas de segurança digital e soberania de dados.
Data centers como infraestrutura essencial e estratégica
No Direito Administrativo, infraestrutura essencial refere-se a bens ou serviços imprescindíveis para a continuidade das funções estatais e bem-estar coletivo. O conceito inclui rodovias, energia, água, telecomunicações e, crescentemente, data centers, dada sua relevância para operações vinculadas à saúde, segurança pública, energia e justiça.
Diante dessa importância, há forte argumento para que os data centers sejam enquadrados como infraestrutura estratégica. Essa classificação reconhece a centralidade dos centros de dados no funcionamento do Estado moderno e reflete a necessidade de regulação robusta, proteção soberana dos dados e controle sobre seu funcionamento.
A discussão jurídica envolve principalmente três perspectivas complementares:
- O atendimento ao interesse público e continuidade dos serviços essenciais;
- A segurança nacional, diante do risco de dependência tecnológica ou controle por entidades estrangeiras; e
- A soberania digital, que exige garantia de localização segura dos dados sensíveis e compliance com a LGPD.
Essas dimensões reforçam a necessidade de tratar os data centers não apenas como ativos privados, mas como elementos estratégicos que demandam regimes administrativos específicos, com exigências de transparência, segurança e sustentabilidade energética.
Regimes jurídicos possíveis: concessão, permissão, autorização e PPPs
Os regimes jurídicos existentes permitem diferentes formas de participação do setor privado na prestação de serviços públicos ou fornecimento de infraestrutura. No caso dos data centers, é possível avaliar sua inclusão em modelos como concessão, permissão, autorização e parcerias público-privadas (PPPs). Cada modelo oferece alternativas para financiar, operar e manter esses ativos estratégicos.
Concessões e permissões
As concessões tradicionais envolvem a contratação de parceiros privados para operar infraestrutura pública, sendo a remuneração feita pelo usuário ou pelo próprio Estado. No contexto dos data centers, esse modelo pode ser aplicado quando o serviço for considerado essencial e houver previsão de tarifa ou pagamento regular.
Já as permissões ou autorizações mostram-se pouco adequadas, em razão da natureza precária e simplificada dessas modalidades, incompatível com a relevância e a complexidade da infraestrutura de data centers. Além disso, os limites temporais e os valores máximos previstos para esses contratos são reduzidos, o que dificulta sua viabilidade para projetos dessa magnitude.
PPPs como estratégia de desenvolvimento
As PPPs surgem como alternativa eficiente para projetos de infraestrutura intensivos em capital e gestão complexa. Por meio de PPP, o parceiro privado financia, constrói e opera o data center, enquanto o Estado garante pagamentos periódicos ou demanda mínima logística. Essa estrutura favorece a alocação eficiente de riscos e o valor agregado ao serviço público.
No Brasil, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) avalia a criação de um fundo voltado a investimentos em data centers e inteligência artificial, sinalizando o interesse do Estado em participar financeiramente do setor.
Além disso, o governo federal planeja isenções fiscais para atrair investimentos estrangeiros, condicionadas ao uso de energia renovável e à reserva de capacidade para uso nacional.
Desafios regulatórios: energia, meio ambiente, e tecnologia verde
Data centers representam alto consumo de energia elétrica e demanda significativa de água para sua operação, o que gera preocupação no planejamento de infraestrutura regulada. Grandes centros dependem de fontes seguras e resilientes para garantir operação contínua, principalmente em regiões sensíveis a recursos escassos.
A instalação de centros de dados exige, em muitos estados, licenciamento ambiental, que pode envolver Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e avaliação de uso de recursos hídricos. Ainda que não tenham regras específicas uniformes, inclusive com relatos de omissão na estruturação regulatória, especialistas e entidades ambientais já defendem o estabelecimento de parâmetros claros.
Incentivos regulatórios também vêm sendo analisados. Debates atuais propõem regimes de licenciamento simplificado aliado à exigência de eficiência energética e hídrica, uso de práticas de TI verde e reaproveitamento de calor residual dos sistemas. Essas medidas visam reduzir o impacto ambiental e promover inovação e competitividade sustentável.
Questão de soberania e segurança da informação
A localização dos data centers em território estrangeiro pode gerar dependência indesejada de empresas que controlam infraestrutura crítica e dados sensíveis. Essa dependência coloca em risco a autonomia nacional e compromete a capacidade do Estado de supervisionar atividades estratégicas.
O conceito de soberania digital reafirma que dados públicos e empresariais relevantes devem estar sob jurisdição nacional. Políticas dessa natureza defendem que informações sobre saúde, segurança, finanças ou justiça fiquem armazenadas dentro do país, sob controle estatal ou de empresas nacionais com critérios rígidos de governança
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e os regulamentos sobre cibersegurança desempenham papel essencial nesse contexto. A LGPD exige que o tratamento de dados pessoais siga fundamentos legais claros e que a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) fiscalize práticas de segurança, incluindo em data centers.
Poucas legislações tratam da proteção específica em dados de segurança nacional, mas a regulamentação da ANPD já representa um avanço significativo em controle e responsabilidade.
Além disso, agentes da sociedade defendem a exigência de que uma porcentagem da capacidade de processamento dos data centers localizados no país seja reservada para empresas nacionais, como forma de incentivar a soberania técnica e reduzir vulnerabilidades à influência externa.
Essas preocupações reforçam a necessidade de regulação que combine segurança jurídica, proteção de dados e estratégias de governança digital para que os data centers se consolidem como infraestrutura confiável e soberana, apta a sustentar os serviços públicos mais críticos.
Perspectivas para o futuro da regulação de data centers no Brasil
O Brasil caminha para reconhecer os data centers como infraestrutura essencial para serviços públicos e para a soberania digital. O debate avança no sentido de criar regras específicas de segurança, transparência e continuidade, acompanhando a crescente demanda por tecnologia e inteligência artificial no setor público e privado.
Ao mesmo tempo, surgem propostas de incentivos fiscais e regulatórios para atrair investimentos, vinculados a metas de sustentabilidade e uso de energia renovável. O desafio é equilibrar inovação tecnológica com segurança jurídica e proteção do interesse público, consolidando os data centers como pilar estratégico da infraestrutura nacional.

Considerações finais
Os data centers consolidaram-se como infraestrutura essencial do século XXI, sustentando serviços públicos e privados de relevância estratégica. Sua regulação envolve desafios que vão da sustentabilidade energética à soberania digital, exigindo soluções jurídicas que combinem inovação, eficiência e proteção do interesse público.
Para profissionais que desejam compreender a fundo essas transformações e atuar com segurança nesse cenário, a Pós-Graduação em Direito Administrativo do IDP oferece uma formação completa e prática, capacitando especialistas para enfrentar os novos desafios da administração pública e das infraestruturas estratégicas.

Referências
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PINCER, Pedro. Preocupações ambientais são levantadas em debate sobre regulamentação de data centers de IA. Rádio Senado, 21 maio 2025. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2025/05/21/preocupacoes-ambientais-sao-levantadas-em-debate-sobre-regulamentacao-de-data-centers-de-ia.
SINTTEC – Sindicato dos Trabalhadores de TI. Data centers de IA chegam ao Brasil com exigências ambientais e energéticas. 30 jul. 2025. Disponível em: https://sinttec.org.br/data-centers-de-ia-chegam-com-exigencias-energeticas/.
SOARES, Ricardo. Com a popularização da inteligência artificial generativa, é preciso incluir os data centers no licenciamento ambiental. Jornal da USP, 19 ago. 2024. Disponível em: https://jornal.usp.br/artigos/com-a-popularizacao-da-inteligencia-artificial-generativa-e-preciso-incluir-os-data-centers-no-licenciamento-ambiental/.