Introdução
Nos últimos anos, o conceito de sustentabilidade ganhou protagonismo no discurso empresarial, especialmente diante dos avanços das pautas ambientais e apoio ao desenvolvimento sustentável.
Termos como “eco-friendly”, “carbono neutro” e “biodegradável” tornaram-se frequentes nas embalagens, campanhas de marketing e relatórios corporativos.
Contudo, essa tendência também trouxe à tona uma prática cada vez mais preocupante: o greenwashing, ou “maquiagem verde”.
Trata-se de uma estratégia pela qual empresas transmitem uma falsa imagem de responsabilidade ambiental, sem necessariamente adotar práticas sustentáveis concretas.
No Brasil, o combate ao greenwashing ainda enfrenta diversos desafios jurídicos, sobretudo diante da lacuna normativa e da necessidade de fortalecimento dos instrumentos de fiscalização e responsabilização.

I – O que é Greenwashing?
O termo greenwashing foi cunhado na década de 1980 pelo ambientalista Jay Westerveld e, desde então, vem sendo utilizado para descrever ações enganosas de empresas que tentam se promover como ambientalmente responsáveis sem o devido respaldo em suas práticas reais.
Em outras palavras, o greenwashing ocorre quando há distorção ou exagero intencional sobre a sustentabilidade de produtos, serviços ou políticas corporativas.
Essa prática pode ocorrer de diversas formas: desde o uso de símbolos ou cores que remetem à natureza, até a veiculação de mensagens que sugerem preocupações ambientais inexistentes.
Por exemplo, uma empresa que anuncia seus produtos como “verdes” ou “naturais”, mas não possui certificações ou comprovações técnicas que justifiquem tais alegações, está praticando greenwashing.
Além de ser uma prática desonesta, o greenwashing compromete a credibilidade das agendas ambientais, engana os consumidores e dificulta a diferenciação entre empresas realmente comprometidas com a sustentabilidade e aquelas que apenas aparentam sê-lo.
II – O marco legal brasileiro e os limites atuais
No Brasil, ainda não existe uma legislação específica que trate exclusivamente do greenwashing, o que dificulta a caracterização precisa da prática e a responsabilização efetiva das empresas. No entanto, é possível aplicar uma série de normas e princípios jurídicos para combater condutas enganadoras.
Para as relações de consumo, o CDC (Lei nº 8.078/1990) é o principal instrumento utilizado para coibir práticas de greenwashing, especialmente com base nos seguintes dispositivos: (i) Art. 6º, IV: direito à informação clara e adequada; (ii) Art. 37: proibição de publicidade enganosa ou abusiva; e (iii) Art. 39: vedação a práticas comerciais desleais.
Sob a ótica do CDC, alegações ambientais infundadas podem ser enquadradas como publicidade enganosa, sujeitando a empresa à responsabilização civil, administrativa e até penal.
Já na perspectiva civilista, a responsabilidade civil por danos materiais e morais decorrentes de publicidade enganosa ou lesiva ao meio ambiente também pode ser fundamentada nos arts. 186 e 927 do Código Civil.
A Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), embora não mencione expressamente o greenwashing, prevê sanções para condutas que causem dano ao meio ambiente ou que dificultem a sua proteção, inclusive no campo da informação ambiental.
No que tange à seara do direito concorrencial, a Lei nº 12.529/2011 estabelece que empresas que utilizam o greenwashing para obter vantagens competitivas indevidas podem ser investigadas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), especialmente se tal prática representar concorrência desleal.
Com o advento das pautas do ESG e do avanço dos temas de sustentabilidade, o Marco Regulatório da Publicidade Sustentável também se tornou um marco na legislação brasileira sobre o tema.
Atualmente, não há um marco regulatório consolidado no Brasil sobre publicidade ambientalmente responsável. Contudo, iniciativas como o Guia de Publicidade Verde do CONAR (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária) e as diretrizes da ISO 14021 (norma internacional sobre rotulagem ambiental) ajudam a orientar a conduta das empresas e servem como referência para julgamentos administrativos e judiciais.
III – Desafios Jurídicos e Institucionais
A ausência de legislação específica sobre greenwashing no Brasil gera insegurança jurídica tanto para consumidores quanto para empresas que atuam de forma ética. Além disso, outros desafios persistem.
A multiplicidade de selos ambientais — muitos dos quais são criados pelas próprias empresas — dificulta a verificação da veracidade das alegações. Uma regulação que padronize critérios e institua certificadoras independentes é essencial para evitar abusos.
Além disso, os órgãos ambientais e de defesa do consumidor ainda carecem de infraestrutura técnica e recursos humanos suficientes para monitorar e auditar informações ambientais divulgadas por empresas.
Ainda que seja uma pauta de grande valia para todos, outro desafio é a baixa litigiosidade em prol da sustentabilidade. O número de ações judiciais relacionadas a greenwashing ainda é reduzido, o que revela falta de conhecimento sobre o tema por parte de consumidores, advogados e membros do Poder Judiciário.
Por fim, um desafio de grande relevância é o conflito entre sustentabilidade e interesses econômicos. Atualmente, as empresas que buscam aderir a práticas sustentáveis de forma genuína enfrentam desvantagem competitiva frente àquelas que apenas simulam compromissos ambientais. Isso reforça a urgência de punições efetivas para desestimular o greenwashing.
IV – Caminhos para o fortalecimento do combate ao Greenwashing
Inicialmente, um dos caminhos que precisa ser percorrido exige que o Congresso Nacional institua uma lei sobre rotulagem e comunicação ambiental, com definições claras sobre greenwashing, exigências de comprovação e penalidades proporcionais à gravidade da infração.
Empresas engajadas com os princípios de Environmental, Social and Governance (ESG) devem adotar critérios rígidos para a comunicação de seus compromissos sustentáveis, sob pena de sofrerem impactos reputacionais, legais e financeiros.
Além disso, a capacitação social é necessária. Campanhas educativas voltadas para consumidores e empresários podem ampliar a consciência crítica, permitindo que o público identifique práticas enganosas e pressione por transparência.
A partir da aplicação prática de tais condutas, é necessário o incentivo à criação de certificadoras idôneas e acreditadas por órgãos oficiais pode aumentar a confiabilidade dos produtos e serviços considerados sustentáveis.
Por fim, é necessário um maior protagonismo do Ministério Público e da Defensoria Pública na fiscalização e autuação. Essas instituições possuem instrumentos jurídicos — como ações civis públicas e termos de ajustamento de conduta (TACs) — que podem ser utilizados para responsabilizar empresas que praticam greenwashing em escala coletiva.

Conclusão
O greenwashing figura como um sério obstáculo para a consolidação de uma cultura de sustentabilidade no Brasil. Ao disseminar informações falsas ou enganosas sobre impactos ambientais, as empresas não apenas frustram a confiança dos consumidores, mas também comprometem o desenvolvimento de práticas empresariais verdadeiramente responsáveis.
No cenário jurídico, a ausência de uma legislação específica impõe desafios significativos à repressão do greenwashing. Ainda assim, é possível utilizar normas já existentes — como o Código de Defesa do Consumidor, o Código Civil e a Lei de Crimes Ambientais — para coibir tais práticas, especialmente quando integradas a ações de fiscalização, autorregulação e educação ambiental.
A superação desses desafios depende de um esforço conjunto entre poder público, empresas e sociedade civil, com vistas à construção de um ambiente regulatório claro, eficaz e que premie o compromisso real com a sustentabilidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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