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Como ocorre a evolução dos Direitos Humanos

A Origem dos Direitos Fundamentais

As ciências humanas não possuem marcos bem definidos acerca da criação de ideias. Estas, naturalmente, evoluem a partir das discussões entre contemporâneos e se concretizam de forma gradual. O mesmo ocorre com os direitos humanos: ao longo da história sempre é possível ver lapso destes, mas não com a mesma conotação contemporânea. Todavia, é extremamente determinante como sendo a origem dos direitos fundamentais.

Por exemplo, o historiador inglês Ian Mortimer, em seu livro “Séculos de Transformações”, narra como a Igreja Católica aboliu a instituição da escravidão nos territórios da cristandade, principalmente no Ocidente. Inclusive, no Sínodo de Londres, há declaração direta pelo fim da comercialização: “(…) ninguém jamais deveria voltar a praticar o negócio infame, predominante em toda a Inglaterra, de vender homens como animais”.

A melhor interpretação é a do jurista francês Michel Villey, o qual entende os direitos fundamentais como um produto da filosofia moderna oriunda do século XVII, a qual, por sua vez, é inspirada pelas fontes da teologia, dos estudos da Bíblia. Tal escolha não é arbitrária. Com a secularização gradual da filosofia, a análise de direitos ganha novos horizontes. Não direitos intrínsecos apenas a cristãos, mas direitos para os povos de forma indeterminada, os quais deveriam ser respeitados pelos respectivos Estados.

Eis uma das principais características dos direitos humanos contemporâneos: a possibilidade de ser invocada para além de um sistema jurídico nacional. É um direito intrínseco ao ser humano, o qual deve ser resguardado pelos Estados, assim como pelas organizações transnacionais, como a ONU.

A mais famosa declaração de direitos humanos é a forjada no calor da Revolução Francesa de 1789. Trata-se da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão. Neste documento histórico, estão elencadas as garantias básicas. Todavia, como muito bem observado pelo historiador Hobsbawm, na verdade, tais direitos, embora enunciassem ser de todos, se limitavam a proteger o interesse da burguesia — mais especificamente, como bem observado pela pensadora contemporânea da revolução, Olympe de Gouges — para o homem burguês, não para as mulheres, independente de classe.

Como se expandem os direitos humanos?

A resposta mais curta para a pergunta é que os direitos humanos se expandem conforme a evolução histórica, mais especificamente, em consonância às preocupações sociais. Em sua grande maioria, os direitos humanos não nascem em abstrato, sem que tenham relevância social, pois é apenas a partir dos temores e preocupações da sociedade que estes direitos surgem.

Na França de 1789, havia grande preocupação com as liberdades básicas do cidadão, como o direito à liberdade de expressão, pois qualquer crítica à monarquia poderia ser vista como ato de traição e imediatamente censurada. Igualmente, havia grande preocupação com o direito de propriedade, o qual era constantemente violado pelo Antigo Regime e seus impostos sufocantes. Os revolucionários também tinham grandes anseios por maior participação política, com a limitação do poder real — justamente como forma de impedir a situação de tirania experimentada pelo Terceiro Estado.

Em meio a estas preocupações, os revolucionários formularam os direitos humanos que, atualmente, catalogamos como direitos fundamentais de primeira geração ou dimensão, que são os direitos relacionados à liberdade, em sua mais ampla abrangência: de expressão, de locomoção, de contrato, bem como os direitos políticos e os direitos de propriedade. Portanto, os direitos humanos de primeira geração estão intrinsecamente relacionados às demandas de sua época, da Revolução Francesa, principalmente aos apelos da elite intelectual e financeira burguesa.

O Estado que se origina baseado nos direitos fundamentais de primeira geração é extremamente passivo; se limita a não interferir nas esferas privadas de seus cidadãos. Isso deu certo até a massificação, acompanhada das crises humanitárias oriundas das guerras que devastaram a Europa: a Primeira e a Segunda Guerra Mundial.

Em meio a este cenário, direitos políticos, de liberdades e de propriedade já não eram suficientes para responder aos anseios da sociedade. Tornou-se imperativa a criação de novos direitos humanos, os quais permitissem às pessoas se reerguer e prosperar. Estes novos direitos, os quais denominamos de direitos humanos de segunda geração ou dimensão, estão relacionados ao social, econômico e cultural.

Surge, então, por exemplo, a seguridade social, a qual tem por objetivo, entre outras funções, garantir sustento mínimo às pessoas incapazes, bem como aos idosos que já não podem prover seu próprio sustento. Igualmente, há uma maior intervenção do Estado na economia, com o objetivo de resguardar os interesses sociais, mas não a ponto de prejudicar ou inviabilizar a atividade privada.

O Estado que se origina dos direitos humanos de segunda geração tem como característica marcante uma atitude ativa. Não é mais um Estado apenas passivo, com obrigações de não interferência, mas com obrigações ativas e dever de agir em aspectos essenciais da sociedade.

Em decorrência da preocupação com a natureza — muito relacionada às recorrências dos desastres naturais e sua massificação —, além da preocupação com a preservação da história e monumentos artísticos, surgem os direitos humanos de terceira geração e dimensão.

Por fim, atualmente, frente aos avanços tecnológicos, há a possibilidade de afirmarmos que estamos na aurora dos direitos humanos de quarta geração, os quais têm como foco a tecnologia, em especial, a internet. Os espaços virtuais crescem de importância, a ponto de sobrepujarem os próprios espaços públicos de interação física. Portanto, nessa nova realidade, é imperativo estabelecer novos direitos fundamentais aos usuários da rede.

Inclusive, caso queira estar por dentro das discussões acerca dos direitos digitais, recomendo que leia o nosso blog do IDP — mais especificamente, o artigo “Constituição e Internet: o que precisa ser discutido atualmente?”. Tal artigo aborda exatamente a fonte das discussões da regulamentação da internet e situa o leitor neste tema essencial.

Conclusão: os direitos humanos como frutos de seu tempo

Não se pode esperar que uma pessoa no século XVIII fosse idealizar a possibilidade de direitos sobre a internet, ou sobre a natureza e cultura. Simplesmente, não havia tais preocupações em voga em tal tempo. As preocupações dos revolucionários franceses do século XVIII eram completamente distintas das preocupações de pessoas que viviam na Alemanha pós-guerra.

Como se observou ao longo da exposição, os direitos humanos se expandem em consonância com a realidade social. Eles não surgem de forma abstrata e sem contexto histórico, mas são oriundos de necessidades e observações empíricas da realidade. Eis a importância de contextualizar historicamente tais direitos.

Outra informação fundamental é destacar que a evolução dos direitos humanos não é, em hipótese alguma, substituição de uma geração por outra. Os novos direitos humanos de cada geração integram os direitos humanos previamente existentes em um quadro em constante expansão.

Há outra característica interessante dos direitos humanos, que é a sua aderência às democracias e como a derrocada destas ocasiona o recuo dos direitos humanos. Igualmente interessante é analisar as ondas democráticas. O termo “onda” é proposital, pois, com certa regularidade, se vê uma expansão e retração das democracias ao redor do mundo.

Tais temas são de extrema importância e, provavelmente, serão abordados no blog do IDP. Mas, caso não consiga esperar o nosso artigo sobre tais temas, por gentileza, não perca tempo em se inscrever nos nossos cursos de pós-graduação — tanto especialização quanto mestrado. O IDP conta com uma gama de professores muito bem formados e de vasta experiência no mercado de trabalho. É a união perfeita entre teoria e prática.

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Referências:

VOLVELLE Michel, A Revolução Francesa 1789 – 1799, 2. ed. rev. – São Paulo: Editora Unesp, 2019

VILLEY Michel, Questões de Tomás de Aquino sobre direito e política. 1. ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2014.

MINOIS, George. História da Idade Média: mil anos de esplendores e misérias. 1 .ed. São Paulo: Editora Unesp, 2023.

HOBSBAWN, Eric J. A Era das Revoluções 1789-1848. 6. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.

MENDES, Gilmar Ferreira, Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

MORTIMER, Ian, Séculos de transformações: em mil anos de história, qual o século passou por mais mudanças e qual a importância disso. 1° ed. Rio de Janeiro: Difel, 2018.   

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