No Direito Administrativo, motivo e motivação são conceitos fundamentais que garantem a legalidade e a transparência dos atos da Administração Pública. Embora intimamente relacionados, esses conceitos têm funções distintas. O motivo se refere ao fato ou direito que justifica a prática do ato, enquanto a motivação é a exposição desses motivos, servindo como justificativa formal para o ato.
Este artigo aborda as diferenças entre motivo e motivação, as implicações jurídicas de cada conceito, e como ambos se relacionam com a Teoria dos Motivos Determinantes, além de explorar posições doutrinárias e jurisprudenciais sobre a obrigatoriedade de motivação.
O que é motivo?
O motivo é a situação de fato ou de direito que justifica a prática de um ato administrativo. É o elemento que impulsiona a Administração Pública a agir e, sem ele, o ato carece de validade. Por exemplo, no caso de uma infração funcional, o motivo seria a infração cometida pelo servidor que justifica uma punição, como a suspensão ou demissão.
O que é motivação?
A motivação é a explicitação dos motivos que levaram à prática do ato administrativo. Ela serve para garantir que a Administração Pública atue de maneira transparente e justifique suas decisões. A motivação está prevista no artigo 2º, parágrafo único, VII, da Lei 9.784/99, que impõe à Administração o dever de expor os pressupostos de fato e de direito que justificam a decisão adotada.
Diferença Entre Motivo e Motivação
Embora motivo e motivação sejam frequentemente confundidos, eles são distintos. O motivo é a razão subjacente ao ato administrativo, enquanto a motivação é a explicitação dessa razão. O motivo está relacionado à existência de uma situação fática ou jurídica que autoriza o ato, enquanto a motivação é a justificativa formal que a Administração deve fornecer.
Apesar das frequentes confusões, a diferença entre motivo e motivação é clara: o motivo é o fato que autoriza o ato, e a motivação é a exposição textual desse fato.
Posições Doutrinárias Sobre a Obrigatoriedade da Motivação
A doutrina não é unânime quanto à obrigatoriedade da motivação nos Atos Administrativos. Existem diversas posições sobre o tema:
- Primeira posição: A motivação é obrigatória para os atos vinculados e facultativa para os atos discricionários (Hely Lopes Meirelles).
- Segunda posição: A motivação é obrigatória nos atos discricionários para controle da discricionariedade e facultativa nos vinculados, onde os elementos conformadores já estão previstos em lei (Oswaldo Aranha Bandeira de Mello).
- Terceira posição: Todos os atos administrativos, vinculados ou discricionários, devem ser motivados, com base nos princípios democráticos e de transparência (Maria Sylvia Zanella Di Pietro).
- Quarta posição: A motivação só é obrigatória se houver previsão legal expressa. Fora disso, ela não é um requisito indispensável (José dos Santos Carvalho Filho).
- Quinta posição: A motivação é obrigatória apenas para atos decisórios ou quando a lei expressamente exigir (Diogo de Figueiredo Moreira Neto).
Teoria dos Motivos Determinantes
A Teoria dos Motivos Determinantes estabelece que, uma vez que a Administração Pública explicita os motivos de um ato, ela fica vinculada a eles. Se os motivos apresentados forem falsos ou inexistentes, o ato poderá ser anulado. Essa teoria é amplamente aceita pela doutrina e jurisprudência brasileiras, sendo um mecanismo que evita arbitrariedades administrativas.
Assim, se o ato administrativo for motivado, mesmo que a motivação não fosse obrigatória, os motivos apresentados devem corresponder à realidade. Caso contrário, o ato será invalidado.
Motivo de Fato e Motivo de Direito
Os motivos podem ser classificados em dois tipos:
- Motivo de fato: Refere-se à situação concreta que permite à Administração escolher entre diferentes opções. Por exemplo, a dispensa de licitação por motivo de emergência é uma escolha discricionária, baseada em fatos específicos.
- Motivo de direito: Refere-se à obrigatoriedade de praticar um ato diante de uma situação jurídica estabelecida. Um exemplo seria a aposentadoria compulsória de servidores públicos ao atingirem 75 anos, prevista no artigo 40 da Constituição Federal.
Enquanto o motivo de fato confere uma margem de discricionariedade à Administração, o motivo de direito está vinculado à lei.
Motivação aliunde ou per relationem
A motivação aliunde, também chamada de per relationem, é uma forma de motivação em que a justificativa do ato está em outro documento, como pareceres ou decisões anteriores. Esse tipo de motivação é aceito no Direito Administrativo brasileiro e permite que a Administração remeta a justificativa a um ato anterior, desde que este tenha fundamentação adequada.
A motivação aliunde é bastante comum em processos administrativos complexos, nos quais o ato decisório se baseia em pareceres técnicos ou relatórios emitidos por órgãos especializados.
O momento da motivação
A motivação deve ser apresentada no momento da prática do ato administrativo, ou imediatamente após. No entanto, o STJ admite que a motivação possa ser posterior, desde que os motivos que embasaram a decisão já existissem quando o ato foi praticado.
Isso permite que a Administração Pública corrija eventuais omissões de motivação, desde que os fatos justificadores sejam idôneos e preexistentes.
Congruência entre o motivo e o resultado do ato
A validade de um ato administrativo depende da congruência entre o motivo e o resultado do ato. A Administração deve assegurar que o motivo apresentado justifique adequadamente o resultado alcançado. Caso contrário, o ato poderá ser considerado inválido.
De acordo com a Lei 4.717/1965, que regula a ação popular, um ato administrativo é nulo se os motivos que o justificam forem inexistentes ou inadequados em relação ao resultado. A congruência entre motivo e resultado é fundamental para a manutenção da legalidade e da justiça nas decisões administrativas.
Exceções à Motivação
Em alguns casos, a motivação pode ser dispensada. Um exemplo clássico é a exoneração de servidores ocupantes de cargos comissionados, que pode ocorrer sem a necessidade de apresentação formal dos motivos (exoneração ad nutum). No entanto, se a Administração optar por motivar o ato, ela fica vinculada aos motivos apresentados.
Considerações Finais
O motivo e a motivação são pilares da legalidade e da transparência na Administração Pública. Enquanto o motivo se refere à causa que justifica a prática de um ato, a motivação é a exposição formal dessa justificativa. A correta aplicação desses conceitos é essencial para garantir o controle social e judicial dos Atos Administrativos.
A Teoria dos Motivos Determinantes reforça a importância de que os motivos apresentados pela Administração estejam em conformidade com a realidade dos fatos. Dessa forma, assegura-se que os atos administrativos sejam praticados dentro dos limites da legalidade, prevenindo arbitrariedades e fortalecendo a confiança dos administrados nas decisões públicas.
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Referências
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