O procedimento administrativo para punição de empresas pela prática de corrupção
A corrupção é um problema social que pode gerar consequências significativas para a sociedade e é um dos maiores desafios que afeta a credibilidade das instituições públicas e privadas no Brasil e no mundo. Para enfrentar esse problema no Brasil, diversas medidas legais, como a criação de leis e o fortalecimento de entidades públicas fiscalizadoras, foram adotadas ao longo dos anos como forma de combater essas condutas ilícitas.
Entre as principais medidas destaca-se a Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) que, entre as suas principais determinações, busca responsabilizar empresas envolvidas em atos ilícitos contra a administração pública.
Nesse sentido, a Lei Anticorrupção prevê que a responsabilização de pessoas jurídicas por ilícitos previstos naquela norma será feito por meio do Processo Administrativo de Responsabilização (PAR). O PAR pode levar à aplicação de sanções de multa e publicação extraordinária da decisão, além das sanções previstas na Lei nº 14.133/2021 (Lei de Licitações e Contratos), como a declaração de inidoneidade e o impedimento de licitar.
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Neste artigo, vamos explorar os principais aspectos do Processo Administrativo de Responsabilização (PAR), abordando desde a base legal até as sanções aplicáveis, os acordos de leniência e o impacto futuro dessa legislação no ambiente corporativo brasileiro.
Lei Anticorrupção Brasileira
A Lei Anticorrupção foi sancionada em 2013 e é um marco no combate à corrupção corporativa no Brasil. Diferente de outras normas que focavam na punição de pessoas físicas, essa lei visa punir pessoas jurídicas envolvidas em atos lesivos contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
Os atos ilícitos tipificados na norma estão previstos em seu art. 5º e incluem: (i) prometer, oferecer ou dar vantagem indevida para agente público, fraudar licitações e contratos públicos e dificultar atividades de fiscalização.
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Um dos principais pontos da Lei Anticorrupção, e que foi objeto de amplo debate doutrinário e jurisprudencial, é o fato de ela ter introduzido a responsabilização objetiva das empresas, o que significa que não é necessária a comprovação de dolo ou culpa dos administradores ou colaboradores para que a empresa seja punida, apenas o nexo causal entre a conduta e o ilícito cometido.
As sanções podem incluir multas elevadas, que podem ir de 0,1% a 20% do faturamento bruto da pessoa jurídica, até a declaração de inidoneidade, caso os ilícitos cometidos sejam também estejam previstos na Lei de Licitações e Contratos, o que coloca as empresas em uma posição de maior cautela e fiscalização interna.
O Processo Administrativo de Responsabilização (PAR)
O Processo Administrativo de Responsabilização (PAR) é o mecanismo previsto na Lei Anticorrupção por meio do qual os órgão da Administração Pública, entre eles a Controladoria-Geral da União (CGU), investigam e punem empresas envolvidas em atos de corrupção.
De acordo com a Lei Anticorrupção, a competência para instaurar o PAR, que é um processo administrativo sancionador, é da autoridade máxima da entidade pública que tenha sido lesada pelos supostos atos de corrupção, ou, concorrentemente, da CGU, que se tornou o órgão de referência no combate à corrupção no país.
O PAR, que deve ter prazo de duração de 180 dias prorrogáveis, começa com a instauração formal do procedimento administrativo, que pode ser feito por meio de denúncia, relatório de auditoria ou qualquer outro indício de irregularidade. Após a instauração, é designada uma Comissão composta por dois ou mais servidores estáveis daquele órgão público, que ficaram responsáveis pela análise dos fatos e dos argumentos de defesa e, posteriormente, emitir um relatório final com suas conclusões.
Cabe destacar que durante o Processo Administrativo de Responsabilização devem ser garantidos os direitos constitucionais à ampla defesa e ao contraditório, o que possibilita que a empresa se defenda das acusações e apresente provas contrárias.
Após a fase de apresentação de defesa e do conjunto fático probatório e da emissão de relatório final pela Comissão do PAR, será proferida decisão pela autoridade máxima do órgão de tramitação do procedimento, decidindo pela responsabilização, ou não, da pessoa jurídica.
Sanções Aplicáveis às Empresas
A Lei Anticorrupção estabelece sanções severas para as empresas condenadas em um Processo Administrativo de Responsabilização. Essas sanções servem tanto para punir quanto para dissuadir futuras práticas corruptas, dentro de um aspecto educativo, promovendo maior compliance nas empresas.
O desfecho do PAR pode resultar na aplicação de sanções de multas e de publicação extraordinária da decisão condenatória, que são as punições previstas na Lei Anticorrupção, além das sanções previstas na Lei de Licitações e Contratos, conforme explicado anteriormente.
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Também não se pode ignorar que a aplicação dessas penalidades pode gerar sérios danos reputacionais para as empresas o que, por si só, pode ter um impacto considerável na continuidade de suas atividades.
No entanto, o Decreto nº 11.129/2022 (Decreto Anticorrupção) prevê fatores capazes de atenuar, ou até mesmo agravar, a multa aplicada em face das empresas. Entre as atenuantes previstas estão a colaboração com as autoridades e a implementação e manutenção de um programa de integridade eficiente, ou seja, mesmo que a empresa seja punida com base na lei, ela pode receber benefícios caso invista em um programa de compliance efetivo.
Acordo de Leniência e Termo de Compromisso
Outros mecanismos relevantes que podem dar fim ao Processo Administrativo de Responsabilização por meio da celebração de acordos entre a entidade pública e a pessoa jurídica responsabilizada são o Acordo de Leniência e o Termo de Compromisso (antigo julgamento antecipado).
Inspirado nos acordos firmados em casos de cartel, o acordo de leniência, que está previsto na Lei Anticorrupção, permite que a empresa colabore com as investigações por meio do fornecimento de informações relevantes e confesse seus ilícitos. Em contrapartida, a empresa pode obter redução de penalidades ou até o afastamento de certas sanções.
O acordo de leniência é visto como uma ferramenta essencial para desmantelar esquemas de corrupção complexos, pois facilita os trabalhos investigatórios por meio do oferecimento de um incentivo claro para as empresas, mas sem deixar de responsabilizá-las. Por esse motivo, para que o acordo seja válido, a empresa deve cessar completamente a prática ilícita e adotar medidas efetivas de compliance.
Já o termo de compromisso, que anteriormente era conhecido como julgamento antecipado, está previsto na Portaria Normativa nº 155/ 2024 da CGU, e é mais uma forma de encerrar o Processo Administrativo de Responsabilização por meio da celebração de um acordo entre as autoridades e a pessoa jurídica investigada.
No termo de compromisso, a empresa também deve admitir sua responsabilidade pelos atos investigados e cessar a prática dos ilícitos, podendo receber um desconto no valor da multa e a dispensa de aplicação da sanção de publicação extraordinária da decisão, a depender do momento processual em que é apresentado.
No entanto, diferentemente do acordo de leniência, o termo de compromisso se limita às alegações do Processo Administrativo de Responsabilização e apenas pode ser celebrado pela CGU, já o acordo de leniência pode ser firmado por outras entidades públicas lesadas e nele pode haver a apresentação de novos fatos relevantes.
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Conclusão
O Processo Administrativo de Responsabilização é um pilar fundamental no combate à corrupção no Brasil, e a Lei Anticorrupção trouxe avanços significativos no enfrentamento dos ilícitos empresariais contra a administração pública. As sanções, aliadas a instrumentos como o acordo de leniência e ao medo das empresas de possíveis danos reputacionais, buscam promover um ambiente corporativo mais transparente e ético no país.
As empresas, por sua vez, devem se adaptar continuamente às exigências legais, investindo em programas de compliance que assegurem a conformidade com a legislação. Uma tendência futura é o fortalecimento dos mecanismos de transparência e fiscalização interna dentro das empresas, o que pode ser acelerado por tecnologias como inteligência artificial e big data, que auxiliam na identificação precoce de comportamentos ilícitos.
Agora que você conhece os principais aspectos do Processo Administrativo de Responsabilização, que tal aprofundar seus conhecimentos em Direito Administrativo com a nossa Pós-Graduação?
Referências:
BRASIL. Controladoria Geral da União. Como fazer um acordo. Acordo de Leniência. Disponível em: https://www.gov.br/cgu/pt-br/assuntos/integridade-privada/acordo-leniencia/como-fazer-um-acordo. Acesso em: 23 de set. 2024.
BRASIL. Controladoria Geral da União. Lei Anticorrupção – Aspectos gerais. Perguntas Frequentes. Disponível em: https://www.gov.br/corregedorias/pt-br/assuntos/perguntas-frequentes/lei-anticorrupcao-aspectos-gerais. Acesso em: 23 de set. 2024.
BRASIL. Controladoria Geral da União. Processo Administrativo de Responsabilização (PAR). Perguntas Frequentes. Disponível em: https://www.gov.br/corregedorias/pt-br/assuntos/perguntas-frequentes/processo-administrativo-de-responsabilizacao-par. Acesso em: 23 de set. 2024.
BRASIL. Lei n. 912.846, de 1º de agosto de 2013. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm. Acesso em: 23 de set. 2024.
BRASIL. Controladoria Geral da União. Portaria Normativa n. 155, de 21 de agosto de 2024. Disponível em: https://www.in.gov.br/web/dou/-/portaria-normativa-n-155-de-21-de-agosto-de-2024-581125693. Acesso em: 23 de set. 2024.
BRASIL. Controladoria Geral da União. Termo de Compromisso. Responsabilização Entes Privados. Disponível em: https://www.gov.br/corregedorias/pt-br/assuntos/painel-de-responsabilizacao/responsabilizacao-entes-privados/termo-de-compromisso. Acesso em: 23 de set. 2024.
BRASIL. Ministério Público Federal. Acordos de Leniência. Combate à Corrupção. Disponível em: https://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr5/publicacoes/guia-pratico-acordo-leniencia/. Acesso em: 23 de set. 2024.