Princípios, Limites e Aplicações
O federalismo brasileiro é um sistema que distribui o poder entre diferentes entes federados – União, Estados e Municípios – com o objetivo de garantir autonomia política e administrativa a cada um deles. No entanto, existem situações em que essa autonomia pode ser temporariamente suspensa por meio de um instituto constitucional chamado intervenção.
No caso dos Estados, a intervenção estadual é uma medida excepcional adotada para restabelecer a ordem jurídica e proteger o pacto federativo. Neste artigo, exploramos os princípios, limites e aplicações da intervenção estadual no contexto do federalismo brasileiro.
O que é a Intervenção Estadual?
A intervenção estadual é o mecanismo pelo qual um Estado pode intervir em um município para garantir o cumprimento de determinados preceitos constitucionais ou enfrentar situações que comprometam a ordem pública e o bem-estar social. Trata-se de uma medida temporária, de duração limitada, e que só pode ocorrer com base em hipóteses previstas na Constituição Federal.
Com caráter excepcional, a intervenção estadual é aplicada apenas em situações extremas, quando o município não consegue ou não está cumprindo suas obrigações fundamentais. Durante a intervenção, a autonomia do município pode ser temporariamente reduzida, a fim de preservar o equilíbrio do pacto federativo e garantir o bom funcionamento do sistema de governança local.
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Hipóteses de Intervenção Estadual
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 35, define as situações em que um Estado pode intervir em seus municípios. Essas hipóteses são taxativas, ou seja, a intervenção só pode ocorrer nos casos expressamente previstos no texto constitucional. As principais hipóteses incluem:
- Deixar de ser paga, sem motivo de força maior, por dois anos consecutivos, a dívida fundada;
- Não forem prestadas contas devidas, na forma da lei;
- Não tiver sido aplicado o mínimo exigido da receita municipal na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde;
- O Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar a observância de princípios indicados na Constituição Estadual, ou para prover a execução de lei, de ordem ou de decisão judicial.
Essas hipóteses representam situações em que a administração municipal está comprometida, justificando uma ação corretiva por parte do Estado para garantir a execução de obrigações essenciais.
Tipos de Intervenção Estadual
A intervenção estadual pode ocorrer de duas formas: espontânea ou provocada.
1. Intervenção Espontânea
A intervenção espontânea ocorre quando o governador decide, por iniciativa própria, intervir em um município. As hipóteses que permitem esse tipo de intervenção estão previstas nos incisos I, II e III do artigo 35 da Constituição, como o não pagamento de dívidas, a falta de prestação de contas ou o descumprimento dos mínimos constitucionais em saúde e educação.
Nesse tipo de intervenção, o governador emite um decreto que estabelece os limites, as condições e a duração da medida. Esse decreto precisa ser submetido à Assembleia Legislativa em até 24 horas, para que o controle político seja exercido. Se a Assembleia rejeitar o decreto, a intervenção deve ser imediatamente cessada.
2. Intervenção Provocada
A intervenção provocada depende de uma decisão judicial ou de uma representação formal. Prevista no inciso IV do artigo 35, ela ocorre quando há descumprimento de princípios constitucionais estaduais, leis ou decisões judiciais por parte do município.
Nesse caso, o processo começa com uma ação movida pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado, que encaminha o pedido ao Tribunal de Justiça local. Se o Tribunal aceitar, emite uma requisição ao governador, que é obrigado a decretar a intervenção. Nesse tipo de intervenção, o controle pela Assembleia Legislativa é dispensado, pois o processo já envolve o Poder Judiciário.
O Processo de Intervenção
A intervenção estadual é formalizada por meio de um decreto emitido pelo governador. Esse decreto deve especificar a amplitude, as condições e o prazo da intervenção. Em casos mais complexos, pode ser nomeado um interventor, responsável por corrigir as irregularidades que motivaram a intervenção.
Durante o período de intervenção, as autoridades municipais podem ser afastadas de seus cargos. Uma vez resolvidas as causas que originaram a intervenção, as autoridades afastadas retomam suas funções, a menos que haja impedimento legal.
Cessados os motivos que justificaram a intervenção, o município retorna à normalidade administrativa e o decreto interventivo perde sua eficácia.
Limites Constitucionais e Controle do Legislativo
Apesar de ser uma ferramenta necessária, a intervenção estadual está sujeita a rígidos controles constitucionais. Além das hipóteses previstas no artigo 35, a Constituição exige que qualquer decreto de intervenção seja submetido à aprovação da Assembleia Legislativa em até 24 horas. Caso o Legislativo não aprove o decreto, a intervenção deve ser imediatamente interrompida.
Esse controle político é fundamental para evitar que a intervenção estadual seja usada de forma arbitrária ou abusiva. A Assembleia Legislativa tem a função de fiscalizar o ato do Poder Executivo, assegurando que a medida atenda aos requisitos legais e constitucionais.
Nos casos em que a intervenção é provocada por decisões judiciais, o controle legislativo é dispensado, uma vez que o processo já envolve o Poder Judiciário.
A Intervenção no Contexto do Federalismo Brasileiro
O federalismo brasileiro caracteriza-se pela autonomia dos entes federados, com União, Estados e Municípios possuindo competências próprias e independentes. No entanto, o sistema também prevê mecanismos de controle e intervenção para assegurar que nenhum ente comprometa a ordem jurídica e o bem-estar social.
A intervenção estadual é uma dessas ferramentas, sendo fundamental para garantir que os municípios cumpram suas obrigações constitucionais. Seu objetivo é evitar que a má administração ou o descumprimento de leis comprometam a governança local e a prestação de serviços públicos essenciais.
Diferentemente da intervenção federal, que pode ser aplicada tanto em Estados quanto em municípios localizados em territórios federais, a intervenção estadual se restringe aos municípios dentro de um Estado. Além disso, a intervenção é sempre uma medida de última instância, aplicada apenas quando outros meios de resolução não surtem efeito.
Comparação com a Intervenção Federal
Embora este artigo trate da intervenção estadual, é interessante traçar comparações com a intervenção federal, que também está prevista na Constituição Federal. A intervenção federal ocorre quando a União intervém em Estados, no Distrito Federal ou em municípios de territórios federais, conforme os artigos 34 e 35 da Constituição.
A intervenção federal têm hipóteses mais amplas, incluindo situações como:
- Manter a integridade nacional;
- Repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra;
- Pôr termo a grave comprometimento da ordem pública;
- Garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação;
- V – reorganizar as finanças da unidade da Federação que:
a) suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior;
b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei;
- Prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial;
- Assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:
a) Forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) Direitos da pessoa humana;
c) Autonomia municipal;
d) Prestação de contas da administração pública, direta e indireta;
e) Aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.
A intervenção federal pode ser decretada tanto de forma espontânea quanto provocada por decisões judiciais. Assim como a intervenção estadual, o decreto federal também está sujeito a controle político, sendo avaliado pelo Congresso Nacional.
Conclusão
A intervenção estadual é uma ferramenta indispensável para a preservação da ordem federativa no Brasil. Ao garantir que os municípios cumpram suas obrigações constitucionais, ela assegura a integridade do sistema de governança e protege os direitos da população.
No entanto, por ser uma medida excepcional, a intervenção deve ser usada com cautela e dentro dos limites constitucionais, garantindo que a autonomia dos municípios seja restaurada o mais rápido possível.
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Referências
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